Pedaço de broa

 

Entro na velha casa rústica já sem cor. Tudo é castanho e cinzento lá dentro. Cheira a agulhas de pinheiro e folhas secas de eucalipto.

 

Ainda perdura no ar o calor aconchegante do forno a lenha e um agradável aroma a pão acabado de cozer anuncia que daqui a pouco anoitece e é hora da ceia.

 

Algumas brasas mortiças iluminam tenuamente a cinza da lareira.  Sento-me á mesa. A pequena janela deixa entrar pouca claridade mas sabe bem estar na penumbra a saborear alguns minutos de descontração.

 

A velha e desbotada toalha xadrez vermelha e branca cheira a lavado, em cima um cesto de pão com um aroma delicioso. Parece ter sido ali colocado há poucos minutos. Sabe bem estar ali no silêncio, com a escuridão cada vez mais profunda como cúmplice de momentos de relaxe e  conforto.

 

Olho melhor para o cesto. Um pedaço de broa destaca-se por entre três pães de centeio. A sua superfície dura e rugosa invoca-me montanhas douradas pelo por do sol na serra. Lembra-me rochas que ladeiam um Mar agitado. Lembra-me caminhadas vagarosas no meio da Natureza.

 

Aquele simples pedaço de broa transporta consigo memórias das árvores que deram a lenha para a dourar, os cereais que lhe deram corpo, os utensílios que a ajudaram a entrar no forno e as mãos curtidas de quem a envolveu carinhosamente depois de bem curtida pelo calor.

 

Aproximo-me, retiro o pedaço de broa do cesto. Aspiro o seu odor agradável a farinha. Sinto a solidez da sua côdea, percorro vagarosamente as superfícies rugosas. É como estar a tocar numa sólida pedra de granito que esconde no interior algo de mais sensível.

 

Reparo que o pedaço de broa ainda está morno. No seu interior, um miolo mais  fofo e húmido.

 

Há muito que os pássaros recolheram ao conforto dos ninhos. A noite abate-se sobre os campos verdes e húmidos. Uma agradável sensação de conforto se intensifica e deixa-me com a prazerosa sensação de completude.

 

Este momento de paz e introspeção preenche-me, realiza-me, faz-me sentir viva. Se pudesse, estaria aqui por toda a Eternidade. Assim vale a pena viver, sentir e refletir. Assim vale a pena saborear simplesmente a vida!