Tuesday, October 12, 2021

“à noite as marginais são sempre escuras”

 

Esta foi a frase que ficou de mais uma agitada noite repleta de peripécias noturnas. Não sei dizer se as marginais à noite eram escuras, negras ou pretas. Alguma dessas três palavras. Foi a frase que ficou, embora sem palavras exatas.

 

Por onde começar de modo a isto tudo ter sentido, embora seja uma tarefa impossível.

 

Lembro-me que estava a lanchar num sítio com amigos da ACAPO. Uma das minhas vizinhas também lá estava e tinha rapado o cabelo. Disse-me que se estava a preparar para emigrar para a  África Do Sul. Era lá que já se encontrava toda a família.

 

Encontro-me agora em casa dos meus pais onde algo de muito estranho se está a passar com algumas luzes e com a energia elétrica. A eletricidade ameaça liquidar-nos. As luzes fluorescentes estão intermitentes. Todas elas, o que é estranho. Para além de piscarem sem parar, fazem um barulho muito estranho e ameaçador na minha forma de ouvir as coisas. De vez em quando, para alimentar mais o meu horror, ainda lançam pequenas faíscas.

 

Indiferente a isso, a minha mãe estava a fazer a cama no seu quarto. Eu ordenava aos berros que saísse dali. Iria acontecer alguma coisa, eu tinha essa convicção. Ela limitava-se a olhar para as luzes a piscarem. Agora até as lâmpadas normais piscavam e faziam aquele barulho que se ia tornando mais insuportável. Eu já me estava a passar. Ela continuava. Queria que eu fosse desligar o quadro elétrico mas eu sentia que já nada havia a fazer. Entretanto o barulho progredia. A casa rugia e reclamava sacrifícios humanos. Foi então que se ouviu um som mais forte. Era uma música e vinha da rua. ainda bem, um pretexto para sairmos daquele inferno.

 

Passava uma corrida de bicicletas. O pelotão colorido pedalava pela estrada cinzenta ao lusco-fusco. Estávamos agora na rua. nada nos podia acontecer. Ainda bem que passaram justamente neste momento! Tive a convicção de que nos salvaram a vida.

 

Agora vem a parte mais confusa. Preparava-me para fazer uma longa viagem. Era outro final de tarde. Esperava eu por uma médica com quem tinha trabalhado. Supostamente era ela a minha companheira de viagem. Caminhava com uma sandes de entremeada ou entrecosto. Algo do género que me tornava as mãos gordurosas. Ela parou na berma da estrada e eu não teria tempo de me deslocar a qualquer lugar para lavar as mãos. Então tive uma ideia genial. Tinha chovido. Havia enormes poças de água nos passeios. Então mergulhei lá as mãos. Depois limpei-as ao guardanapo onde vinha embrulhado o pão.

 

Encontrava-me numa sala de aulas que é sempre a mesma, por mais que o sonho mude. Disse há uns tempos que talvez seja uma mistura de todas as salas de aulas que frequentei ao longo do meu percurso académico. Foi nessa sala que foi proferida a frase que dá título a esta crónica onírica. Em que contexto foi proferida, passou-me completamente ao lado.

 

Eu fiquei a refletir naquilo. Com um misto de temor e entusiasmo, assimilei essas palavras. Viajaria de noite. Seria uma longa viagem de carro. Seria uma bela altura para confirmar essa afirmação.

 

Ao acordar ainda pensei nesta frase. Seriam as marginais ou as autoestradas? Seria mais lógico serem as autoestradas. Passamos por quilómetros delas de Expresso e nem uma luz se vê. Pelo menos no início do século era assim. Nas marginais, que eu saiba, há luz.

 

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