Thursday, August 26, 2010

S. Martinho do Porto 2010


Concerto de final de tarde e de férias

Era o nosso último dia de férias em S. Martinho do Porto. O dono da unidade hoteleira que há oito anos nos recebe resolveu oferecer-nos um generoso lanche. Muitas pessoas como eu nem se deslocaram ao restaurante para jantar.

Enquanto o lanche não começava, deu para ver um pouco da etapa do dia da Volta a Portugal. É impressão minha, ou estou ali a ver camisolas da Rabobank? O quê? Mas serão mesmo camisolas da Rabobank? Haverão equipas portuguesas com equipamento parecido? Não pode ser!

Ainda a magicar nas camisolas que para mim são inconfundíveis e que acabava de ver no meio do pelotão português, dirigi-me ao refeitório com os meus colegas para saborear aqueles petiscos que se apresentavam em cima da mesa.

Havia de todo o tipo de petiscos: chouriço assado, moelas, salada de orelha, salsichas, carapauzinhos e polvo. Para acompanhar havia pão e a saborosa broa amarela tão típica daquela localidade. O repasto era regado com vinho, sumos e cerveja.

Eu bebi uma cerveja e comi essencialmente chouriço assado, orelha e pão. Toda a gente encheu a barriga e depois regressou à sala de convívio onde Emanuel tocava viola e nós cantávamos a plenos pulmões algumas músicas.

Chegou a altura de cada um cantar a música que melhor sabia. Eu resolvi cantar a música que, de há dois anos a esta parte, costumo cantar em tempo de praia- o tema do Nel Monteiro que fala da Juju e que eu cantava à minha gata. É incrível como ainda havia gente que não conhecia esta música! É mesmo imperdoável, tendo mesmo em conta que eu costumo-a cantar regularmente. Já havia mesmo entre a assistência quem prometia arranjá-la e ficou mesmo a promessa de ser aquele o hino para as férias de 2011. Um pouco atrasado, não!

Uma amiga nossa começou a cantar também temas antigos da...Alexandra. Há que tempos que eu não ouvia uma das músicas que ela cantou! Depois, a mesma colega nossa, que por acaso canta extremamente bem e que se pode dizer que passou ao lado de uma grande carreira musical, começou a cantar acompanhada pela sua filha de quatro anos o tema “You And I” dos Scorpions. E não é que a miúda o sabe cantar! É impressionante! Com aquela idade ela não saberá, com certeza, Inglês.

O tempo passou a voar. Houve quem se fosse arranjar para ainda ir jantar ao restaurante. Como não tinha fome, resolvi subir, arranjar as minas coisas e ver um pouco de televisão. Andavam a arranjar a TV Cabo, por isso não vi convenientemente o “Quem Quer Ser Milionário”.

E assim acabou mais uma semana de descanso. Segunda-feira já tenho de ir trabalhar, que até me consolo.

Na companhia do Herman



Férias são férias, não é verdade? Depois de ter cumprido à risca o prazo de leitura do livro de José Saramago “A Viagem Do Elefante”, resolvi também dar uns dias de férias aos livros e não iniciar a leitura de uma nova obra. Isso ficaria para quando regressasse ao trabalho.

Para férias levei um livro com anedotas. Nada mais apropriado. Como eu sou péssima a contar anedotas, resolvi levar um livro com as melh9ores anedotas do Herman José como cábula. Eu nunca me lembro de uma anedota na íntegra. Assim corria menos risco de me engasgar. Há gente que tem tanto jeito para contar anedotas que, mesmo que a anedota não tenha o mínimo de piada, já toda a gente se ri da forma como a pessoa a conta. Eu não tenho esse dom. Também não posso ter jeito para tudo.

Transcrever para aqui as três anedotas a que achei mais piada também é uma tarefa difícil mas vou tentar:

Em terceiro lugar ficou:

Numa loja de tapeçarias, uma senhora soltou uma flatulência enquanto se baixava para consultar o preço de um tapete. O empregado logo acorreu ao local e perguntou:
- Então, minha senhora, há algum problema?
Embaraçada, a mulher responde:
- Não há nada, estou só a ver o preço deste tapete persa. É demasiado caro!
O empregado responde:
- Ainda bem que a senhora olhou para o preço deste tapete! Se tivesse olhado para o preço do que está ao lado borrava-se toda.

Em segundo lugar escolhi esta anedota, ainda no mesmo registo:

Iam três jovens de sexualidade alternativa num táxi. Cada um deles soltou uma bufa que quase não fez barulho mas que cheirou pessimamente mal. Então o taxista aproveita e lança uma bojarda bem barulhenta que se terá até ouvido a milhas. Eufóricos, os homossexuais gritaram em coro:
- É VIRGEM!

E a minha eleita é:

Dois indivíduos jogavam golfe. Um deles estava a demorar uma eternidade para executar uma jogada. Impaciente o seu companheiro perguntou:
- Então amigo, isso ainda demora muito?
O outro desculpa-se:
- Sabes, é que a minha mulher está ali desde há bocado a observar-me daquela janela e quero que esta jogada saia perfeita.
Então o outro disse:
- Não vale a pena amigo, deixa-te disso! Daqui dificilmente lhe vais conseguir acertar.

Vá, riam-se!

O homem mais bonito que alguma vez vi

Não houve tempo de apontar o que quer que fosse para posteriormente colocar neste espaço. Muitos dos sonhos que tive nesta altura de férias na praia, em que se dormia muito mais do que habitualmente, não foram registados, por incrível que pareça, apesar de ter levado o caderno. Quanto menos se faz, menos se tem vontade de fazer.

Lembro-me de ter sonhado que me calhou algum dinheiro no Euromilhões ou no “Quem Quer Ser Milionário” mas o sonho que tenho mais presente é este que passo a descrever.

Era uma altura em que o Ciclismo Tandem na ACAPO tinha voltado em força. Estávamos a fazer uma espécie de Down Hill por um trilho algo íngreme. Apesar de a estrada já estar alcatroada, havia um trilho que ainda apresentava pedras de elevado grau de perigosidade. Todos nós envergávamos t-shirts brancas. Uma prova das antigas com todos os protagonistas do passado e do presente.

Havia, no entanto, um pequeno problema- o do costume, diga-se- não havia guias para tanta gente que ia participar. Eu era uma das pessoas que não tinha guia. Foram então arranjados dois voluntários à pressa. Foi aí que...

Segundo li num livro há uns tempos, quando uma mulher sonha com homens trata-se do seu animus, ou seja, a parte masculina dela a falar através do seu subconsciente ou algo assim. Se uma mulher sonha com um grupo numeroso de homens e eles são bandidos ou algo assim é porque o seu animus não se encontra de boa saúde. Se são homens bons, passa-se o contrário e a mulher está em paz com o seu subconsciente. Se acaso sonha com um homem bastante agradável...

Bem, que dizer deste? Se ele existisse...Tratava-se de alguém que eu não conhecia verdadeiramente. Por vezes nos sonhos tanto aparecem pessoas que conhecemos, como aparecem perfeitos desconhecidos, tal como neste caso.

Foram-me apresentados dois jovens. Um deles era português e chamava-se Luís Filipe. Não seria talvez o que joga no Benfica e esse já é um conhecido meu. Era muito parecido, por sinal. Tratava-se de um jovem com aparência normal, até porque o que estava ao lado passava das medidas.

O outro tinha um nome estrangeiro. Julgo até que o primeiro nome era italiano, algo semelhante a Pierpaolo. Do apelido não me recordo. Era alto e tinha uns cabelos louros como os nórdicos, lisos e macios. A sua pele era branca também como a dos nórdicos. Mais parecia um nórdico e não um homem do Sul da Europa.

Olhava-o como se tivesse esquecido tudo o que me rodeava. A sua imagem penetrava bem fundo no meu espírito. Apresentava-se elegantemente vestido com umas calças pretas e uma camisa em tons de verde e cinzento. Enquanto o olhava sem proferir uma palavra, tinha a noção que jamais na vida tinha visto alguém tão belo.

Olhava-o com grande intensidade quando acordei. Que desilusão! Era apenas um sonho. Na cama ao lado ressonava ainda a minha irmã.

Betinha Irritante regressa à praia

Ver texto “Um dia na praia com Betinha Irritante”

Lembram-se da Betinha Irritante? Aquela criaturinha insuportável que só de falar dela já provoca uma sensação de...vontade de agredir alguém?

Quatro anos depois da nossa última crónica que a teve como protagonista, eis que a encontramos destacada entre um grupo de crianças de uma colónia de férias de um colégio interno. Reconhecemo-la facilmente pelas suas características especiais.

Segundo nos foi possível apurar, já era difícil aos desgraçados dos pais aturar a filha que só lhes dava dissabores. Foi por esta ser quase impossível de aturar que o casal desistiu da ideia de ter mais filhos. Lembraram-se que os restantes rebentos do casal seriam iguais ou piores. Então mais valia aturar uma só, que já lhes dava que fazer.

Betinha cresceu muito...apenas e só em altura. Em termos de comportamento está cada vez pior e parece mesmo um caso perdido. Dará uma bela delinquente do pior que pode haver.

Não foram os pais que a colocaram uma instituição. Apesar de ser difícil de educar, sempre era filha deles e tinham de a aceitar tal como ela era. Na escola é que os problemas foram surgindo. No refeitório arrumou com uma tigela de sopa a ferver à cara de uma colega de turma, foi expulsa durante uma semana mas logo voltou a fazer das suas.

Na aula de Matemática, Betinha que estava nas filas de trás, ia proferindo impropérios sempre que um colega errava uma conta. Farto de ouvir tais murmúrios, o docente ordenou que a aluna se retirasse. Fazendo o máximo de ruído que se possa imaginar, Betinha lá se retirou mas antes teceu um comentário maléfico acerca da orientação sexual do professor. Imediatamente este elaborou uma nota a vermelho para posterior relatório. Num impulso, a aluna Felisberta Andrade tirou a caneta vermelha e o livro de ponto ao professor e riscou-o todo. Quando o professor lhe disse que já estava a passar das medidas, eis que ela lhe ferra um violento pontapé justamente onde ele tinha uma variz saliente.

Devido a esta sucessão de maus comportamentos na escola, o castigo de Betinha foi ir continuar os seus estudos para um colégio interno de onde já tentou fugir aí por uma dúzia de vezes. De nada valeram os apelos dos pais. Betinha deveria ficar por ali até que se comportasse. Pelos vistos esse dia está longe de chegar.

Todos os dias no colégio há problemas com ela. Aparecem torneiras das casas de banho arrancadas selvaticamente, fogo deitado a caixotes do lixo dentro dos quartos, cadeiras e mesas de salas de aula riscadas e todo um rol de vandalismo presente em todo o lado.

Betinha esteve para não ir até ao Algarve com os colegas. Seria o castigo por um ano inteiro de mau comportamento. Mas não havia ninguém para ficar a tomar conta dela e assim lá teve de ir, apesar de se saber de antemão que as férias iriam ser um pesadelo.

Quando a avistámos juntamente com as outras crianças, Betinha ficava para trás juntamente com outra menina mais pequena a quem, alegadamente terá agredido com um valente estalo. Betinha vociferava alto e bom som. Os termos que proferia nem numa tasca seriam permitidos, quanto mais numa colónia de férias. Uma das monitoras agarrou Betinha por um braço e ficou para trás com ela. Não satisfeita, Betinha ferrou-lhe os dentes no braço. A monitora não lhe podia bater no meio da rua.

Havia um casal de turistas que veio do Norte passar umas férias tranquilas ao Algarve. Teve o azar de alugar a sua barraca ao pé das barracas do colégio. O casal tinha uma filha- Mariana- que tinha apenas seis meses de idade. A malvada da Betinha por mais de uma vez arrumou com areia à pobre da bebé.

Também os pais de Mariana merendavam uma bela tarde depois de terem ido molhar os pés e Betinha também os brindou com duas mãos-cheias de areia molhada. A comida ficou imprópria para que continuassem a comer. Foram fazer queixa à monitora que chamou Betinha para lhe dar uma correcção. Esta recusou-se a vir e já corria pelo mar fora.

Aliás, todos os dias havia barulho porque Betinha só queria estar na água a chatear quem lá andava. Mesmo que tivesse acabado de comer, fazia birra para ir para a água. Mas isso é normal. Todos os miúdos desejam estar sempre na água. O que não é normal é uma miúda ir para lá encher baldes que depois transporta para a areia e vai despejar nas costas de quem está estendido nas toalhas a aproveitar o Sol. Muito ela se ria com as reacções das pessoas! Havia quem se assustasse, quem já estivesse a dormir e quase apanhasse um colapso e quem quase apanhasse um choque térmico.

Estava uma senhora vestida a dormir em cima de uma toalha. Foi logo das primeiras a levar um banho de água salgado involuntário. A mulher correu atrás da miúda com uma muleta que trazia mas estatelou-se na areia. Betinha troçou da senhora e foi a correr para o seu canto.

Betinha odiava que outras crianças comessem gelado e ela não. Muitos dos castigos para a má conduta de Betinha eram a privação do habitual gelado que todas as crianças da colónia comiam à tarde. Esse período era de autêntico caos. Betinha vociferava, choramingava, pontapeava barracas e chapéus e batia noutras crianças. Era mesmo insuportável!

Ao terceiro dia de colónia, e para bem de umas férias tranquilas, passou a haver uma monitora encarregue de levar Betinha de volta ao parque de campismo às quatro horas em ponto. Assim toda a gente suspiraria de alívio.

No dia em que encontrámos Betinha, ela resmungava com as outras crianças porque queria o balde da praia maior. Aliás, fora mesmo Betinha quem tinha dado sumiço a esse balde. O que é que ela queria mais?

Ah, criaturinha mesmo insuportável!

Wednesday, August 25, 2010

Isildo

Todos nós sabemos que em África as condições de vida são extremamente difíceis. Que a esperança média de vida é baixíssima comparada com a Europa e com os Estados Unidos. Que existe uma elevada taxa de mortalidade infantil e de complicações durante o parto. Que se morre de doenças infecto-contagiosas como a tuberculose.

Olhamos para estes flagelos do continente africano como meros números. Sentimos pena mas eles estão demasiado longe para nos preocuparmos. Pouco ou nada podemos fazer para ajudar dada a extrema precariedade das estruturas e dos povos.

O caso muda de figura quando alguém que conhecemos é vítima desses flagelos. Numa conversa entre amigos- uma conversa banal- tive conhecimento da morte de Isildo devido a tuberculose. Não pude evitar um certo choque. Como é que alguém da minha idade, com uma licenciatura e que até estava a leccionar numa universidade em Moçambique se deixa levar pela doença até ao desfecho fatal? Simples. Porque é moçambicano e no seu país não existem meios para curar convenientemente a tuberculose.

Já há tempos correu a notícia de que Isildo havia casado em Moçambique e que a sua esposa e a criança que esperavam sucumbiram ambas durante o parto. Em pleno século XXI custa a acreditar numa tragédia dessas. Há cem anos atrás era normal isso acontecer e era muito triste. Pelos vistos em África, mais propriamente em Moçambique, é natural.

Conheci o Isildo já há longos anos. O Presidente da ACAPO veio falar comigo para que eu ajudasse um estudante africano que tinha entrado para a ESEC. Vinha de Moçambique e era totalmente cego. Eu estava no último ano do meu curso e ele acabava de chegar. Estava no Curso de Educação de Infância em que era o único homem da turma. O primeiro encontro deu-se no Pólo 2 da ESEC. Eu raramente lá tinha aulas mas ele passava lá a maior parte do tempo. Aquelas instalações eram miseráveis, refira-se. Ajudei-o no que pude sempre que o encontrava na escola.

Ele passou a frequentar as instalações da ACAPO e a participar em algumas actividades. Fazíamos mesmo questão em que ele participasse para se integrar. Lembro-me de ele ter feito um ou dos treinos de Goalball connosco e de ter ido connosco a um campeonato para os lados de Alverca. Notava-se que ele estava radiante.

Isildo tinha um defeito. Agora ao recordar isto não deixo de sorrir. Chegado de África, encontrou aqui um tipo de mulheres que desconhecia. Eu vejo as africanas como sendo mulheres afáveis e que se vestem de forma colorida, usando os cabelos compridos e enfeitados com ornamentos de flores. Os brincos também serão compridos e de muitas cores. Todas pensam em namorar, casar e ter um lar bem ao jeito tradicional. Nesse dia em que fomos ao Ribatejo, Isildo passou o tempo a cortejar-me mas eu não estava para aí virada. Por várias vezes me perguntou se eu o achava bonito. Na verdade nem era feio, só que eu tinha outras prioridades. Depois virou-se para a professora de ginástica que era do Porto e que estava a estudar em Coimbra. Também ela não lhe ligou. Era outra rapariga do Desporto. Ele não estava habituado a encontrar duas mulheres “um pouco masculinizadas”.

Uns meses depois voltou à carga, desta vez com uma estudante que fazia umas horas no bar da ACAPO. esta é a história que irei recordar dele com um sorriso malicioso na cara. Essa rapariga, tal como eu, usava cabelos bem curtos, vestia roupa desportiva e não usava brincos também. Ao constatar que nós as duas éramos parecidas, começou a questionar-se de que algo de errado se passava com as raparigas portuguesas. A cereja no topo do bolo foi quando ele disse que não era homossexual. Estoirou um coro de gargalhadas entre a pequena assistência. Houve um amigo nosso que quase rebentava as costuras da roupa de tanto rir. Mas o que é que tem a ver uma coisa com a outra? Se calhar a mesma coisa entre se considerar em África uma pessoa que não vê a cem por cento cega? De facto Isildo cá em portugal era amblíope, categoria completamente desconhecia no Continente Negro e que já tem causado alguns contratempos no Desporto Adaptado.

Já havia a desconfiança de que Isildo ainda via mas depois da viagem à Serra da Estrela não me restaram mais dúvidas. Aquela viagem à Serra da Estrela foi bastante emotiva para os moçambicanos que se encontravam a estudar em Coimbra. Isildo parecia mesmo uma criança ao contactar com a neve pela primeira vez. Parecia mesmo uma criança! Eu acompanhei-o durante essa viagem. Tenho imensas fotografias com ele nesse dia. Já perto da hora do regresso, quando já estava prestes a escurecer, íamos pela rua. Eu guiava-o. Para todos os efeitos, ele era completamente cego. A uma distância aí de uns dez metros seguia um grupo de pessoas. Como estava escuro, não estava a reconhecer quem eram. Tinha a impressão de que não eram do nosso grupo mas também pensei que fossem cegos da Covilhã que se tinham juntado a nós para um dia de convívio. Foi ele quem me disse que tínhamos de ir mais para a frente porque aquelas pessoas já não eram do nosso grupo. Foi apanhado.

Toda a gente dizia que o via a andar normalmente na rua sem bengala branca. Um amigo meu que vê um pouco menos do que eu admirava-se de ele passar sem tocar nas portas e que ele próprio por vezes ia contra as portas e as mesas.

Numa das últimas vezes, senão a última em que o vi, estava eu num dos computadores da sala de multimédia da ACAPO. Ele pegou num livro em Braille e começou a ler. Para o testar, fiz uma pasta nova no Ambiente de trabalho do computador que tinha um fundo azul. A pasta era amarela, claro está. Fiquei a saber que ele distinguia as pastas sem saber o que elas tinham escrito. Ainda via bastante. Uns cinco por cento, talvez mais um pouco.

Também me recordo de ele vir para as acções de formação que por vezes se realizam na ACAPO de fato, gravata, pasta à executivo e a tresandar a perfume. Quando soube que ele estava a dar aulas, imaginava-o exactamente assim.

São estas as recordações que irão permanecer para além da morte que o fez partir.

Descansa em Paz, amigo! Viveste pouco tempo mas soubeste desfrutar de todos os prazeres que os poucos anos de vida te proporcionaram.

“A Viagem Do Elefante” (impressões pessoais)



No dia em que a Cultura Portuguesa perde mais um dos seus membros, o actor e humorista António Feio, termino a leitura do livro de outro grande nome que nos deixou recentemente. Nas cerimónias fúnebres de José Saramago, assisti pela televisão a muita gente erguendo as suas obras no ar. Este livro era um dos mais vistos nas mãos erguidas da multidão. Resolvi lê-lo também.

Foi uma leitura bem divertida e agradável e que me fez pensar que certos homens deveriam ser proibidos de morrer. Deveriam cá ficar para continuarem a sua obra única. Onde vamos agora arranjar alguém tão genial como Saramago? Se calhar ainda está para nascer um semelhante. Ou então não voltaremos a ter outro, o que é mais provável.

Falando neste livro escrito já em grande debilidade, acho espantoso como o autor pegou num facto de pouca importância da História de Portugal e a partir daí escreveu esta obra tremenda- a sua penúltima obra. Não sei como Saramago se foi lembrar disto para um romance bem ao seu estilo. Provavelmente achou o episódio engraçado e apaixonou-se por ele ou simplesmente achou que poderia, partindo dali, fazer algo de interessante. Conseguiu-o, diga-se. Das três obras que li do escritor, esta foi a de que mais gostei pela narrativa em si e pela forma fácil como Saramago narra a história e faz as suas divagações.

Tal como acontecia em todos os livros que escrevia, Saramago não deixou de dar as suas tacadas na Igreja sempre que surgia uma oportunidade na narrativa. Aquele episódio do milagre do elefante à porta da Basílica de Pádua foi o maior exemplo disso.

Achei igualmente engraçado o episódio em que a comitiva portuguesa que transportou o elefante até Valladolid se preparar para uma guerra, primeiro com os Espanhóis e depois com a comitiva austríaca que viria buscar o elefante a Figueira de Castelo Rodrigo.

Algumas peripécias da viagem também foram divinais. Aquela dos arquiduques passarem para a frente do elefante só por causa do cheiro dos seus excrementos não deixou de ser curiosa.

Por falar em excrementos: muito gostava Saramago nas suas obras de se referir a personagens a quem deu uma diarreia ou caganeira na boa linguagem de Saramago. Já na obra da polémica- “Caim”- referiu que quando Adão e Eva foram expulsos do Paraíso e andavam sem comer tinham apanhado caganeira. Isso mesmo Adão disse ao anjo, se bem me lembro.

Em suma, foi um livro que adorei ler. O melhor que li até agora de Saramago.

António Feio- a luta chegou ao fim




No dia em que Eunice Munhoz comemora o seu nonagésimo segundo aniversário, eis que acordamos com a notícia da morte de outro homem do espectáculo- António Feio- que há muito vivia lutando bravamente contra o cancro.

Nestas alturas ficamos sem palavras, apesar de já se esperar mais cedo ou mais tarde por este desfecho quando se padece de uma doença terminal. Por mais que se lute, que se batalhe, o cancro é mais forte.

Recordo António Feio essencialmente numa série que ele protagonizou com José Pedro Gomes e outros humoristas que, se não estou em erro, se chamava “Cine Paraíso”. Basicamente o que se fazia era inventar filmes que nunca tinham sido feitos. Nunca perdia um episódio daquilo e fartava-me de rir.

Claro que me lembro da “Conversa Da Treta” também com José Pedro Gomes mas não achava muita piada. Gostava mais do que referi acima. Pode ser que arranje ainda um vídeo de um desses programas.

Nada melhor para homenagear este grande artista que lutou até ao fim do que ver um pouco da obra que nos deixou.

Que descanse em Paz!

Tudo a postos ou quase

A ansiedade em redor das férias já faz os seus efeitos no meu organismo que já padece de alguns distúrbios digestivos enquanto preparo a mala.

Falta apenas um dia de trabalho para a tão merecida semaninha na praia, em S. Martinho do Porto a banhar-me em mar calmo ou com grandes ondas de cinco metros. Mal posso esperar por me pôr ao Sol e me bronzear um pouco. Praia, descanso e alguma diversão esperam-me.

Ainda falta arranjar algumas coisas. Quando sair do trabalho há ainda que fazer umas comprinhas de última hora para que nada falte.

Vamos a ver se não me esqueço de nada.

Tenho aqui várias chamadas não atendidas. Ainda vou ter chatices. Cheira-me que sim. E agora? Como vou fazer com a bagagem? Só faltava mais esta!

Estou já prestes a adormecer quando o telemóvel toca. A esta hora? Era a assistente social da ACAPO a dizer para eu levar o saco para o trabalho. Depois ela passa lá para o apanhar. Só de pensar que tenho de levar este mono no autocarro…bem…já o trouxe da Holanda com o dobro do peso. Lembro-me de andar largos quilómetros e de parar de vez em quando porque não aguentava mais aquilo. Ia-me a ferir as mãos. Agora só tenho de ir com ele até ao trabalho e de autocarro.

O dia vai custar a passar. Vai ser longo. Chegarei a casa bem tarde mas não há crise. Afinal as férias estão mesmo a chegar!

Coisas aparentemente inúteis

Deito-me tarde. Quero deixar o blog devidamente actualizado para quando for de férias. Esta semana não tenho tido mãos a medir para recuperar de um atraso considerável. Estou quase a terminar os meus intentos. Este esforço está a valer a pena.

Cerca de seis horas de sono, com este calor e tudo, ainda dá um tempinho jeitoso para sonhar com alguma coisa. Nem que me lembre apenas vagamente do conteúdo dos sonhos.

Havia uma personagem que era, por assim dizer, uma mistura entre a minha chefe, a minha vizinha e a minha senhoria. Essa criatura tinha o hábito de coleccionar tralha. Já éramos duas. Eu também adoro estar rodeada de todo e mais algum tipo de coisas. Poderíamos ser grandes amigas, não fosse o facto de ela possuir coisas minhas e dizer que as achou.

Num amplo terraço onde havia roupa a secar, havia caixotes com livros e jornais, roupa, mesmo muita roupa e outros objectos. Eu conheci alguns. Até os meus óculos estavam no meio da tralha. Ela não mos queria dar. Tinha-os perdido há tempo e entretanto já havia comprado uns novos. Ainda queria aqueles para a eventualidade de acontecer alguma chatice com os novos. Ela não estava pelos ajustes em devolver todas as minhas coisas, principalmente os meus óculos que não lhe serviam de nada.

Outra figura extremamente teimosa na vida real é o meu pai. Neste sonho também aparece assim a resmungar. Era uma sexta-feira à tarde e havia um jantar de benfiquistas no Luso. Consta que Luís Filipe Vieira iria marcar presença. O meu pai também ia e não se queria atrasar por nada. A minha mãe ainda lhe pediu que o levasse não sei onde, pois estava imenso calor. Equipado a rigor com as cores do Glorioso, o meu pai armou uma das suas desordens e disse que a motorizada não era nenhum táxi.

Acordei com o barulho que vinha do corredor mas depressa voltei a adormecer. Já estava de dia e não tardava que os despertadores tocassem. Terá sido uma meia hora ou um quarto de hora apenas de sono mas deu para sonhar que estava tudo avariado na minha mesa-de-cabeceira. Havia um curto-circuito e não podia ligar nada. Uma luz azul ou roxa, como um relâmpago, surgia da tomada e ameaçava-me com um choque eléctrico caso eu tocasse nas coisas.

Quando acordei, agarrei o telemóvel com convicção e sem medo para o desligar. Tive de acender o candeeiro e também o rádio. Não aconteceu nada. Fui à minha vida.