Saturday, January 30, 2010

“A Jangada De Pedra ” ou “O Ensaio Sobre A Cegueira”?

O sismo que se abateu sobre o Haiti no passado dia 12 gerou por todo o Mundo uma onda de solidariedade. De desportistas a cantores, de actores a escritores todos se prestaram para ajudar.

O nosso Prémio Nobel da Literatura não ficou indiferente e mandou a sua editora lançar uma edição especial do seu livro “A Jangada De Pedra” cujo total das vendas reverte a favor da população do Haiti.

Sendo eu uma admiradora das obras de Saramago, tendo lido duas e gostado, tenno de ver se encontro essa obra que eu ainda não li. Assim, com o meu vício da leitura, estou a ajudar quem mais precisa.

No entanto, não sei quem teve a ideia de ser “A Jangada De Pedra” a ser editada. Não li o livro e ainda não me dignei a ver do que tratava a obra. As únicas que li foram “O Ensaio Sobre a Cegueira” e “Caim”- o tal livro que tanta tinta fez correr. Tenho ainda “O Ano Da Morte De Ricardo Reis” mas não sei onde o arrumei.

No meu entender, “O Ensaio Sobre A Cegueira” não seria mal pensado para ilustrar um clima de caos como este em que mergulhou o Haiti. As descrições que oiço todos os dias fazem-me imediatamente lembrar passagens dessa obra em que é relatada a cegueira da alma e da Humanidade.

Oiço falar em indivíduos que apanham a comida que a ONU e outras organizações não governamentais fazem chegar à população e que depois a vão vender a preços completamente incomportáveis que as pobres famílias que querem alimentar as crianças não podem pagar. Na obra de Saramago, havia também um grupo de cegos que tirava a comida dos outros e a vendia depois.

A falta de respeito para com os outros habitantes (do internamento na obra de Saramago, na cidade de Port Au Prince nesta situação) é um pouco similar. A violência grassa entre os habitantes. Alguns deles, tal como na obra de Saramago, servem-se de armas e nem adianta os soldados tentarem colocar ordem.

Quando o grupo dos personagens de Saramago se viu na rua após o incêndio, deparou-se com uma situação em tudo semelhante á vivida nas ruas do Haiti e que era descrita pela mulher do médico que narrava cenas horríveis aos outros que se encontravam cegos.

Havia pilhagens a armazéns com comida também, cadáveres nauseabundos por todo o lado a serem comidos por animais, lixo acumulado e doenças de toda a espécie. Chega a ser deveras coincidente a descrição dos factos reais com os factos inventados por Saramago.

Desconheço se o escritor já fez esse paralelismo. Talvez não e talvez por isso tenha escolhido “A Jangada De Pedra” a sua obra mais apropriada para apoiar as vítimas deste sismo.

Ia para a consulta, caiu, magoou-se e…a consulta não era ontem

Esta história é completamente verídica e poderia acontecer a qualquer idosa da aldeia que não saiba ler nem escrever e já seja traída pelas artroses nos joelhos.

Às vezes estou eu na consulta nos Covões e aparecem lá idosas de localidades que eu não sei onde ficam mas presumo que sejam lá para a Serra. Levantam-se cedo, vão de ambulância ou de táxi (quando não vão de autocarro e não sabem para que serve uma senha). Tanto trabalho para depois chegarem á recepção e ouvirem dizer:
- “A senhora tem a certeza que a consulta era hoje? É que aqui está marcada só para daqui a seis meses.”

Pobre velhinha! Lá fica especada no corredor da consulta externa sem saber se há-de andar para trás ou para diante enquanto vai arrumando os documentos atabalhoadamente na carteira velha e gasta e vai murmurando o quão infeliz é.

A minha vizinha convenceu-se que havia de ir fazer um tratamento a um olho ontem e lá teve de fazer o sacrifício de ir. Ela até nem estava com muita vontade e fazia mil e uma confusões por causa do transporte para lá. Tudo porque não queria dar “quinze oiros” por um “carro de praça”.

Não sei como ela se deslocou para o consultório. Só sei que, à entrada do edifício, o joelho lhe falhou e ela deu uma monumental queda, batendo com o peito no chão e magoando-se bastante.

Quando se recompôs e finalmente chegou á recepção foi informada de que a consulta afinal era no dia 3 de Fevereiro.

Realmente há dias em que uma pessoa não pode sequer meter os pés na rua.

Ajuda para o Haiti de Coimbra em autocarros da cidade





Todos os dias as imagens de horror que nos chegam do Haiti nos assolam. Como já foi dito aqui mais para trás, logo no dia seguinte à ocorrência da catástrofe, sonhei com destruição de proporções apocalípticas provocada por um raio ou algo do género que destruiu tudo, ficando apenas uma paisagem árida e sem cor.

As descrições de caos e morte ainda continuam inexplicavelmente a povoar o meu subconsciente e desta vez ainda pensei duas vezes antes de colocar os pés em Coimbra, pois tinha de lá ir.

Ouvi na rádio que uma organização de Coimbra ia enviar ajuda para o Haiti e preparavam-se para ir algumas pessoas prestar serviços naquele terreno. Ao ouvir isso comecei a pensar no que é que essas pessoas iam para lá fazer, que se fosse eu não ia submeter-me àquele cenário com cheiro a morte e destruição, que não será nada agradável andar pelas ruas e tropeçar em cadáveres. Quando disseram que essas pessoas já tinham ido em missão aquando do tsunami de 2004, aí eu calei-me porque essa catástrofe foi muito pior e será difícil de igualar.

Adormeci naquela noite. Já era tarde e eu tinha de acordar bem cedo. Como é habitual, sempre que me tenho de levantar cedo no outro dia, vou para a cama mais tarde e é difícil pegar no sono. Deitei-me eram umas duas horas da manhã e acordei por volta das quatro e meia a pensar na minha vida.

Pois bem…era tudo tão real, que tive dúvidas se estava a sonhar. Saí da Rodoviária e percorri todo o trajecto que me levava à paragem onde normalmente costumo apanhar um autocarro. O Céu estava bastante azul mas havia algumas nuvens brancas.

Chegada á paragem, um sentimento de repulsa tomou conta de mim. Ao ver aproximar-se um autocarro lembrei-me que alguns desses autocarros haviam sido usados no Haiti para transportar cadáveres mais eficazmente. O dilema era se havia ou não de entrar e isso dava-me um sentimento de medo, repulsa, angústia, sei lá.

Não sei se apanhei o autocarro nessa manhã. O resto do sonho já se passava ao cair da tarde. O Sol estava a começar a pôr-se e as nuvens produziam um efeito semelhante a uma lâmpada de um candeeiro. Não o tapavam completamente.

Nessa altura entrei num autocarro, escolhi um dos bancos de trás (parece até que entrei pela porta de saída). O ambiente estava animado. Então eu peguei na minha bolsa laranja do mp3 e comecei a ouvir música. Nada de medo ou de angústia. Sentia-me aliviada por o autocarro estar intacto.

Tuesday, January 26, 2010

Gente que não sabe estar num museu




Acidentes acontecem a todos e não é por se ser deficiente visual que a probabilidade de acontecerem destes percalços aumenta, como parte da sociedade pensa.

Houve museus e exposições que tiveram a iniciativa de abrir as suas portas a deficientes visuais. Foram ainda alguns os museus que visitei no âmbito dessas iniciativas, muitas peças delicadas estavam ao nosso dispor e em muitas tocámos. Nunca houve problemas de espécie alguma e as peças foram todas tratadas com a delicadeza que exigiam.

É incompreensível para nós, tantas vezes excluídos da sociedade, como é que pessoas ditas normais não se sabem comportar em museus e exposições.

Vem isto a propósito da notícia de que em Nova Iorque, uma jovem danificou um quadro de Picasso alegadamente por ter tropeçado. Uma senhora sem problemas de visão ou de outra espécie, saliente-se. Apenas por pura distracção e falta de cuidado.

A pergunta que eu faço ao observar tamanho desleixo (e não é só nos museus, é em tudo) é: Seremos nós mais cuidadosos e atentos ou agimos assim para mostrar a todos os outros que não há nada a temer em relação a nós? Talvez um pouco das duas. Se é verdade que, devido ás nossas limitações, nos aprendemos a defender e a estar mais alerta, também não é menos verdade que tentamos agir o melhor possível para provar á sociedade, e também a nós próprios que somos seres capazes tal como todos os outros.

Espetar um cotovelo ou atirar-se para cima de uma obra de arte de um pintor famoso como Picasso? Que deu a esta gente lá nas Américas? Sinceramente, as pessoas sem qualquer tipo de deficiência têm de começar a pensar duas vezes antes de abrirem a boca…ou colocarem os pés.

Monday, January 18, 2010

Italianos, Tomasevic e o Mundial de qualquer coisa

Comecei há poucos dias a ler o livro “Pássaros Feridos” de Coleen McCullough. É uma obra algo grande e difícil de ler. Confesso que não é do meu estilo de leitura favorito mas eu leio um pouco de tudo, mesmo se o livro for grande e complicado.

Por acaso estou a gostar da história. Para ler de madrugada sempre dá um sono mais tranquilo que os livros policiais de que tanto gosto. Então quando o subconsciente anda particularmente activo a trabalhar no que se passa durante a vigília, ainda melhor.

Vem isto a propósito da origem de alguns factos de sonhos que têm vindo a ser bem disparatados ao longo destes últimos dias. Começou com a destruição de uma montanha com quedas de raios e coisas do género. Origem: sismo no Haiti que tudo destruiu.

Depois continuou ontem com estranhos acontecimentos de que já nem me recordo de metade. O ponto alto foi eu estar a olhar da janela da casa de banho para o pátio. A luz da casa de banho estava acesa e eram cerca de sete da tarde de um final de um dia de chuva de Janeiro como os últimos. Estranhamente o Céu estava de um azul-vivo e claro para o que é normal nesta época do ano. Comecei a ver aproximar uma espécie de nuvens negras que faziam sombras humanas que desciam.

Numa primeira fase assustei-me mas depressa vi que essas pessoas (vindas dos céus?) entravam pela porta da minha sala com ar alegre. Exibiam sinais exteriores de riqueza e a todas cumprimentei alegremente de forma efusiva. Acordei precisamente quando beijava e abraçava uma senhora que não conhecia de lado nenhum, tal como não conhecia as outras.

Mas vamos aos sonhos desta noite que também são de um disparate pegado. Como atrás referi, a obra que eu ando a ler teve aqui um papel fundamental. Li uma passagem do livro em que a personagem apanhou piolhos na escola. Imediatamente o pai tornou as culpas aos italianos seus colegas que primavam pela falta de higiene. Revoltado, o chefe de família dirigiu-se a casa dos transalpinos e atirou-os todos aos bebedouros dos cavalos. Italianos porcos como tudo então. Pois bem…

A cena passa-se provavelmente em Coimbra. Há uma competição em que participam algumas comitivas de atletas de diversos países. Portugal iria jogar uma partida de Futebol com a sua congénere de Itália. Não me perguntem para que competição era isso, que eu não sei responder. Até sei- para a competição do disparate.

Vejam lá que o treinador do Nacional da Madeira, Predrag Jokanovic, (um regresso ao universo dos meus sonhos mais de uma década depois), treinava a selecção da Bélgica e deixou um casaco pendurado numa espécie de balneário onde eu e outras pessoas que não conheço estávamos a fazer voluntariado. Seria uma adaptação onírica dos balneários do Pingo Doce?

Eu comentava: “Como este homem mudou!” Ele estava a discutir não sei com quem. Com um seu jogador, provavelmente, mas falava muito alto. Também isto teve a ver com o jogo entre o Sporting e o Nacional de ontem à noite.

Aproximava-se a hora do jogo e já se sentia o estádio a fervilhar. Sentada no meu posto bem ouvia a algazarra do público. Um conjunto de atletas envergando fatos de treino azuis da selecção italiana invadiram o espaço. Iam às casas de banho antes dos jogos, mais quando o nervoso miudinho de antes da competição lhes atacava o organismo. A adrenalina fazendo estragos. Pensava que também assim era comigo e com outros atletas antes da competição. Os grandes craques também assim eram. Estava ali a meditar nessas coisas e nem dei pela saída deles.

Uma das minhas colegas, alguns minutos depois e com ar indignado, perguntou-me se eu tinha visto quem tinha usado as casas de banho depois de ela as ter limpo. Eu disse-lhes que tinham sido alguns italianos. Foi então que ela me disse que tinha colocado umas toalhas novas na casa de banho e simplesmente os transalpinos fizeram delas papel higiénico. Muito porcos, estes italianos! Enquanto escrevo estas linhas, justamente estas, ouço uma música italiana no meu computador que pode muito bem ser a banda sonora.

Quem ganhou o jogo não sei mas os italianos em badalhoquice e mau comportamento foram os reis.

No dia seguinte, alegadamente, a competição era o salto em comprimento. Só havia dois atletas em competição- eu e…Tomasevic. O dia estava óptimo para a prática de Desporto ao ar livre. A relva em volta do corredor de saltos estava verdinha e eu estava lá sentada enquanto esperava. Éramos dois mas a demora era tanta ou mais do que se estivessem aí uns vinte atletas para saltar. Era o meu regresso. Perguntei ao Senhor Mário por que carga de água demoravam tanto a medir o raio de um salto.

Estava algo nervosa e o meu adversário tinha um pouco de medo pois nunca se havia aventurado, por incrível que pudesse parecer, a se atirar para uma caixa de areia. Estava tão nervoso que…perdeu comigo.

Há também uma explicação para esta última parte do sonho. Primeiro houve o jogo entre o Sporting e o Nacional, como atrás referi, mas antes houve a primeira jornada da liga 3.1 do Maxithlon. Os meus atletas, com uma série de recordes pessoais, venceram a primeira jornada. Nos saltos houve um atleta de uma das equipas adversárias que era muito alto e ficou em último. A mesma observação que eu fiz- a de que não era possível um atleta bem alto fazer um resultado tão péssimo perante oponentes mais baixos- fiz em relação ao defesa montenegrino do Nacional que estava a competir comigo. Eu que já não salto para a areia desde 2004.

E assim vão as olimpíadas oníricas. Aguarda-se nova maratona de disparates.