Monday, February 14, 2022

A mulher na banheira

 

Sete da tarde. Após um exaustivo dia de trabalho, Rosa chega finalmente a casa. Atira com a carteira para cima da cama impecavelmente feita e vai tirando apressadamente a roupa.

 

A saia foi abandonada no chão, as meias cor de pele ficam a um canto sob forma de novelo. Os sapatos há muito que ficaram à entrada do quarto. Do casaco nem deu conta de onde ele foi parar, tal é o cansaço.

 

Apetece-lhe tomar um banho de imersão. Relaxar. Esquecer do tempo. Já há muito que não tem um tempo só para si. Será hoje?

 

O seu marido está em viagem de negócios. Ela encontra-se  sozinha e não tem vontade de fazer mais nada, nem de ver a sua série favorita na Netflix.

 

Descalça e seminua, desloca-se vagarosamente para a casa de banho. A banheira sorri para ela. Pede para  ser preenchida com água quente e para soltar agradáveis vapores aromáticos.

 

Desfazendo-se do resto das roupas, rosa percorre a prateleira com os seus produtos de higiene. Ao fundo encontra-se esquecida uma caixa cor de pele. São uns sais de banho que comprou quando visitou paris há dois anos. Comprou por impulso e depressa se esqueceu deles. Hoje iria experimentar.

 

Despejando uma generosa quantidade de bolinhas de sais de banho na palma da sua mão, rosa olhou para eles. Eram pérolas brilhantes que, sob o efeito da luz, se  transformavam em muitas cores. Ela ficou parada a contemplar esse inusitado espetáculo de luz e cor antes de o os lançar na banheira já quase a  transbordar de água quente.

 

Assim que atirou as bolinhas de sais de banho à água, rosa sentiu desprender-se uma agradável nuvem de vapores. O aroma era o mais agradável que alguma vez já sentiu. Aquele perfume inebriava-a, levava-a para outra dimensão. Perfeito para quem queria relaxar e se abstrair do Mundo.

 

Entrando cautelosamente na água, rosa verifica que a temperatura está perfeita. Nem muito quente, nem muito fria. Ela que pouco acerta com a temperatura da água habitualmente.

 

Sente um  agradável arrepio, como se uma força poderosa lhe acariciasse a pele nua e lhe provocasse inebriantes sensações de prazer.

 

Cobrindo o seu corpo  com a água, somente com a cabeça á superfície, rosa vai relaxando, vai perdendo a noção do tempo e do espaço. Os vapores que se soltam cada vez mais da água vão enevoando a sua mente. É como se uma poderosa  droga circulasse nas suas veias e lhe tolhesse a razão.

 

Pensamentos languidos se apoderam dela e o seu corpo reage. Algo lhe acaricia a pele e lhe causa poderosos arrepios de prazer.

 

Ela vai percorrendo o seu corpo lentamente, tocando cada milímetro de pele que já se encontra sensível ao toque. É como se fosse uma força poderosa a  tocar-lhe.

 

Ao mesmo tempo, ela sente-se relaxada como nunca se sentiu em quarenta anos de vida. Há quanto tempo não se mimava? Há quanto tempo não se apercebia do seu corpo? Trabalho, família e rotina estavam a privá-la de tais prazeres solitários que uma banheira de água quente e um punhado de sais de banho lhe podia proporcionar.

 

Deixando-se levar cada vez mais para o caminho do sonho, ela imagina prazeres proibidos, surgem-lhe pensamentos de luxúria que ela jamais imaginou ter. o vapor dos sais causava-lhe estranhas sensações. Levou-a para um mundo perversamente perigoso. Estava a relaxar, estava a sentir-se revigorada.

 

O tempo passou, rosa nem deu conta de a água arrefecer. Espasmos de frio sacudiam-na violentamente. Sentia-se gelada. A luz ainda estava acesa mas havia algo mais.

 

Não sabendo que horas eram, rosa fez menção de se erguer daquela água gelada. Algo parecido com areia boiava no fundo.

 

Quando se tentou levantar, reparou que mal se sustinha de pé. Parece que alguma coisa lhe havia sugado a energia. Foi a custo que se enrolou numa toalha branca e se dirigiu para o quarto.

 

Olhando para o relógio, constatou que eram já três da madrugada. Iria dormir um pouco ou iria direta para o trabalho?

 

Incrivelmente sentia-se esgotada. Os seus olhos começavam a ficar pesados. Tinha mesmo de se deitar.

 

Ao vestir o pijama, rosa detetou estranhas marcas na pele. Algo como arranhões de um vermelho vivo. Enquanto os analisava à luz fraca do candeeiro, um raspar constante se fez ouvir vindo da casa de banho.

 

Uma forma indistinta feita de algo como areia surgiu á entrada do quarto. De um salto, Rosa se pôs alerta mas já era tarde demais. A figura de areia e cristais de sais de banho investia sobre ela.

 

Horas mais tarde, no trabalho, a colaboradora pontual e exemplar faltava pela primeira vez em mais de quinze anos na empresa.

 

1 comment:

Graça Alves said...

Encontrei, Eunice. Gostei de ler!