Friday, July 14, 2006

Final de tarde inesquecível

Já há muito tempo que não acordava tão bem disposta! Estaria a adivinhar que aquele dia iria ser tão especial? Só sei que me senti como há muito tempo não me sentia. Se não fossem as lesões da queda no treino da véspera tudo estava perfeito.

Acordei até a rir alto. Tinha sonhado com o Jos Van Emden (mal sabia eu que iria estar com ele algumas horas depois). Não me lembro bem do sonho. Mas o que me fez rir foi um outro sonho. O meu subconsciente já estava no Mundial 2006 que estava prestes a começar. A cena passava-se num jogo entre uma equipa dos Balcãs e a Holanda. As equipas estavam perfiladas para ouvir os hinos nacionais. Durante a entoação do Hino Nacional da Sérvia (ou do país adversário da Holanda), um jogador de nome Dragoslav riu-se. O árbitro nem deixou que o Hino terminasse. Saiu de onde estava e apresentou-lhe o cartão vermelho. Acordei à gargalhada e depois pensei: “num jogo a sério, esta situação poderia acontecer? Poderia um árbitro expulsar um jogador antes de um jogo começar? A equipa entraria já com dez jogadores ou substituiria o jogador expulso, visto que a partida ainda não tinha começado?” Quem souber de arbitragem que faça o favor de me esclarecer que sou ignorante nessas leis tão insólitas que nunca acontecem. E se acontecessem realmente?

Sentia-me bem e pronto. Algo me fazia sentir assim, mas não dava para detectar a causa de tanta euforia. O dia estava belo e a temperatura naquela manhã também estava amena. Saí à rua. Só a perna é que me doía um pouco. Se calhar nem ia dar para treinar naquele dia. Afinal não ia precisar de treinar mesmo. Aquela tarde seria especial.

A caminho da ACAPO encontrei um colega meu e fiquei a observar se ele ia bem colocado no passeio. À quinta-feira chego sempre um pouco mais tarde e o tempo passado no computador mal dá para ver o correio. Parece que naquele dia comecei mesmo por ver as notícias do Ciclismo. Em boa hora me lembrei que começava o Grande Prémio CTT Correios. Essa prova iria passar pela Região Centro e a Rabobank Continental estava presente.

O ano passado a prova passou por Coimbra e Figueira da Foz, mas era impossível eu ir lá porque tinha muitas dores nos olhos e não tinha vontade nenhuma de sair de casa. Fiquei triste porque era uma oportunidade que tinha de estar com eles e, provavelmente, não haveria mais nenhuma. Nessa Prova a Rabobank Continental venceu colectivamente e eu fiquei bastante satisfeita. Num momento tão difícil como aquele, precisava de algo que me animasse.

Fui logo à Internet e vi que era naquele dia que a prova passava por perto. Logo meti mãos à obra para tentar contactar com alguém para me ajudar. Havia contactos de pessoas ligadas à organização e eu entrei em contacto com elas. Prontamente se oferecerem para me prestar todo o apoio. Foram impecáveis!

O resto do dia foi passado numa roda-viva. Ainda não sabia se ia até á Figueira da Foz, mas algo me dizia que ia ter sucesso. Naquele dia estava anormalmente confiante, alegre e com uma boa sensação a invadir-me o espírito. Só a greve dos autocarros da cidade me aborrecia um pouco. E eu que pensava que essa greve não me iria afectar! É que eu não costumo andar de autocarro.

Ainda sem saber o que me esperava arrisquei então ir para a Figueira da Foz. Alguns amigos aconselharam-me a não ir porque chegaria lá muito tarde. Mesmo assim arrisquei.

No comboio encontrei um casal de enfermeiros reformados que iam, curiosamente, para o mesmo hotel. Umas nuvens esquisitas como eu nunca vi invadiram o Céu e faziam prever que algo se iria passar. Realmente algo se passou, mas no dia seguinte.

O telemóvel tocou. Apesar de ser tarde, eles esperariam por mim. O resto da viagem foi feito a conversar com as pessoas que havia encontrado. Apesar de toda a euforia, não podia esquecer que o dia seguinte iria ser complicado. Haveria uma reunião que prometia ser tensa. Ao olhar para aquelas nuvens estranhas e bastante negras disse:
-“Vai chover para Coimbra amanhã!”
As pessoas não entenderam o que eu queria dizer e concordaram que aquelas nuvens trariam chuva. Só que a chuva era outra. Fiquei a saber que tenho muito jeito para a premonição. Esperem pelo próximo texto que vai prometer muito.

As nuvens foram desaparecendo à medida que se ia chegando mais perto da Figueira da Foz. Lá o Céu estava azul e a temperatura estava agradável. Tudo estava perfeito para aquele final de tarde que eu jamais iria esquecer e pelo qual esperei tanto tempo.

Apanhei um táxi e rumei ao hotel. À entrada era uma amálgama de cores. Todos os carros da maioria das equipas participantes estavam ali concentrados. Curiosamente não vi o da Rabobank. Um ciclista italiano passeava-se só em toalha junto ao seu carro.

Entrei. O recepcionista já sabia o que se passava e quando viu o primeiro elemento de laranja logo o colocou ao corrente da situação. Quem já lá vinha era o Director Desportivo que parecia conhecer-me bem pelo que foi dito a meu respeito o ano passado. Alguns ciclistas também sabiam que eu tinha problemas nos olhos, que era desportista e perguntavam como é que eu estava agora. Admirei-me como alguns ciclistas que não estavam ali o ano passado também sabiam algo sobre mim.

A conversa foi se estendendo, primeiro com os atletas e Director Desportivo e depois com os outros elementos que dão apoio aos atletas. Eles prepararam-me uma surpresa. Ligaram para o senhor do Algarve que me ajudou o ano passado e que os colocou ao corrente de tudo. Já há muito que não falava com ele porque não tenho tido grande tempo agora com as complicações que por aqui há. Ao ver que eu estava bastante feliz, ele ficou bastante contente por ter, finalmente, realizado aquele sonho.

Um a um, os atletas tiveram de ir descansar para estarem prontos para a jornada do dia seguinte. Também lá estavam os ex-atletas da Rabobank Continental Heijboer e Elijzen que agora alinham na Cofidis. Também tirei fotos com eles.

A conversa estava agradável, mas depressa chegou a hora de apanhar o comboio de volta para Coimbra. Não esperei o táxi junto à entrada porque os senhores fizeram questão que eu fosse para a rua. Deram-me algumas lembranças desta época e continuámos a conversar agora sentados nuns bancos em redor do carro. A noite estava agradável. Sabia bem estar ali a respirar aquele ar puro e a trocar dois dedos de conversa. Parecia que estava a viver um sonho. Por várias vezes me belisquei para me certificar se estava acordada.

O táxi chegou e, com ele, o final desse encontro. Estou profundamente grata a todas as pessoas que contribuíram para que este inesquecível final de tarde se realizasse.

A viagem de regresso foi rápida. Ainda ia a pensar no que tinha acabado de acontecer. Apanhei outro táxi e fui para casa. Aquele final de tarde foi a melhor coisa que me aconteceu ao longo destes últimos anos. Foi algo que irei guardar para sempre na minha memória.

E a reunião do dia seguinte? Estava tão animada que não queria que nada me estragasse aquele estado de graça. Pois é, no dia seguinte iria acontecer algo que eu jamais vou esquecer também. Algo que ainda hoje quando estou a escrever isto me custa a acreditar que aconteceu ali onde eu estou todos os dias. Afinal eu disse que ia chover!

Situação do dia:
O táxi chegou quando eu estava a adorar estar ali. A noite estava amena e a companhia também ajudava a que eu me sentisse feliz. Nem notei que já estava atrasada. Carregada de coisas entrei no táxi e aí iniciou-se uma louca corrida até à estação. Só na estação seguinte consegui ainda apanhar o comboio.

Bacorada do dia:
“Não me importava de ter mais alguns metros.” (e depois para caber nas portas! Já viram o transtorno que era?)

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