Friday, June 16, 2006

Bandeira desumana



Partimos de Coimbra bem cedo para um dia especial. Iríamos fazer parte de um acontecimento único: construir a Maior e Mais Bela Bandeira Nacional do Mundo.

Todas as mulheres estavam felizes com a iniciativa à partida para Lisboa. Um jornalista da SIC entrevistou-me a mim e a outras participantes que mostraram todo o orgulho em fazer parte de algo que jamais se iria esquecer.

A caminho de Lisboa a animação era grande no autocarro onde eu viajava. A música era variada e ia bastante alta- o que permitia que o pessoal cantasse, risse, brincasse e fosse gritando vivas a Portugal.

A chegada a Lisboa, porém, começou por trazer alguma apreensão. Estivemos paradas bastante tempo à espera do almoço enquanto centenas de carros particulares passavam por nós. Algo indiciava que a confusão ia ser muita.

Chegar ao Estádio Nacional não foi nada fácil. Deviam, desde logo, controlar os autocarros a partir da estrada. Afinal, já não íamos chegar lá à hora prevista. Para agravar as coisas tivemos de andar às voltas para estacionar e havia que entregar comida às outras participantes das outras camionetas. Mais tempo que se perdeu evitadamente! Chegou-se a uma altura em que já nem sabíamos para onde ir. Ninguém nos indicava ao certo onde nos devíamos dirigir.

Foi já á entrada do Estádio que se viu que ia haver confusão da graúda. Era difícill as pessoas não se perderem ali. Acho que nunca vi tanta gente junta nem em sonhos. Mas para tanta gente não deveria haver controlo adequado?

Houve mesmo uma altura em que tive bastante medo de cair e ser espezinhada pela multidão que se precipitava para a entrada. Tive de empurrar, espezinhar, beliscar, dar encontrões e até cotoveladas para me poder libertar de apertos e de confusão. Olhava para todos os lados tentando vislumbrar alguém da organização a quem pudesse pedir ajuda. Nem queria acreditar! Ninguém ali estava e as pessoas eram mais que muitas.

Ao sabor dos empurrões que eram o prato do dia e agarrada ás minhas colegas de autocarro de forma quase selvática como um cão se agarra a um osso, entrei finalmente no corredor que dava acesso às bancadas. Fiquei por ali, até porque nem nos conseguíamos mexer. O calor era muito e até dei por mim colada a outra mulher, isto só para se ter uma ideia do que se passou.

A sede ia-se apoderando de mim. O calor era insuportável. Apertada entre aquela gente toda ainda sufocava mais. O problema é que atiravam as garrafas da água-algo impensável. É que podia haver ali uma tragédia se toda a gente tentasse apanhar uma garrafa com o calor que estava e com a sede que, naturalmente, havia. Obviamente que era difícil para mim apanhar as garrafas e os brindes que caíam do céu. Houve quem me desse uma garrafa. Depois perguntaram de quem era uma garrafa. Eu tive de dizer que era minha senão morria de sede.

Ao fim do empurrão nº51672647 lá entrei para o relvado. Iria fazer parte da construção da Bandeira! Nem queria acreditar! Deram-me um capote verde e indicaram-me o local onde deveria ficar. Dos empurrões já me tinha livrado, mas da sede não. É que nem para a Bandeira houve garrafas de água. Foi demais! As pessoas mais sensíveis tiveram mesmo de ser assistidas.

Mas apesar de todos estes contratempos, a animação reinava e o facto de estarmos ali a fazer parte daquela festa minimizava qualquer dificuldade que se tivesse. Participar neste evento estava a ser espectacular apesar de tudo.

Finalmente chegou o tão esperado momento! A Bandeira ficou pronta. A impressionante voz de Dulce Pontes entoou o Hino Nacional. Foi arrepiante e bastante bonito esse momento. Era o culminar de uma festa inesquecível. O objectivo de bater o recorde do Guinness foi conseguido. Muitas mais mulheres poderiam ter participado se as coisas fossem melhor pensadas. Naquele momento senti-me bastante feliz por ter contribuído para que a Maior e Mais Bela Bandeira Nacional fosse construída no relvado do Estádio Nacional.

Sair do relvado foi outra dor de cabeça. Disseram que iam dar brindes e recordações a quem tinha participado na Bandeira. No entanto, não foi isso que aconteceu. Os brindes e os certificados foram dados a quem calhou. Até homens levaram certificados e brindes para casa! Assim não! Gosto sempre de levar uma recordação dos eventos em que participo e a melhor coisa que levei dali foi um filme que eu própria fiz com o momento em que a Bandeira ficou pronta, em que se cantou “A Portuguesa” e em que o recorde foi tornado oficial. Outras recordações? Teria direito a elas se fossem distribuídas quando as pessoas entravam ou saíam da formação da Bandeira. Com a história dos brindes acabei por me perder das outras. De feliz passei rapidamente a revoltada e nervosa com o tratamento que pessoas que fizeram tantos quilómetros levaram.

Nós inscrevemo-nos antecipadamente. Uma das coisas que perguntavam na ficha era se a pessoa tinha mobilidade limitada. Certamente não perguntaram isso porque lhes apeteceu. Seria para zelar pela integridade física e pela segurança das pessoas com deficiência ou com mais idade. Felizmente que não se passou nada de mal com essas pessoas, mas podia ter acontecido. E se tivesse acontecido? De quem era a responsabilidade? Atirar com brindes e garrafas de água à multidão pode ser um perigo. Não percebo porque é que as pessoas não entenderam isso. Estava imenso calor, as pessoas eram muitas. Na Bandeira devia haver voluntários a distribuir água às participantes. E ainda dizem que os portugueses sabem organizar! Bem organizado sim estava o Triatlo de há uma semana atrás. O conceito de organização no Futebol é outro.

A revolta era geral nas imediações do Estádio. De todas as direcções vinham queixas conta a organização. Nem parecia que se tinha acabado de assistir a um acontecimento memorável. Foi debaixo de extrema revolta que chegámos aos autocarros. A viagem de regresso prometia assemelhar-se a um velório.

Houve pessoas que nem entraram sequer no Estádio, outras que ficaram na bancada. Quem não participou na Bandeira tinha brindes e certificados. Havia gente que trazia coisas a mais e fez o favor de as dividir comigo. Se eu tenho um certificado é porque o consegui já dentro do autocarro. Uma senhora que não participou arranjou-me um.

A viagem de regresso a Coimbra acabou por ser menos animada que a ida. A música já estava mais baixa e só se ouviam críticas á forma como as coisas foram organizadas. Toda a gente tinha algo para contar que se relacionasse com confusão e balbúrdia. Cenas de empurrões era o que mais se ouvia contar.

Ao chegar a casa nem queria acreditar ter chegado sem um único arranhão daquele autêntico campo de batalha em que se transformou o Estádio Nacional. Apenas o cansaço se apoderava de mim. Liguei a televisão para ver se ainda estava a dar o Festival Eurovisão mas já tinha acabado. Nunca costumo perder um evento desses. Qual teria sido a canção vencedora? Ainda tive tempo de ver uma reportagem da Bandeira. De facto foi um momento bonito!

1 comment:

GK said...

Estiveste lá! Que fixe!
O verde fica-te bem LOL

Bj.