Sunday, November 26, 2006

Desporto para Deficientes: esse mundo cão

Eu já aqui tive oportunidade de manifestar o meu desencanto por verificar que alguns dirigentes estão a transformar aquilo que deveria ser um exemplo de humanismo, de solidariedade e de confraternização entre pessoas com problemas e interesses comuns em algo monstruoso e selvático.

Estou, naturalmente, a falar do Desporto para Deficientes a nível mundial. Ao ver aqueles três atletas no pódio com as suas medalhas ganhas com tanto suor e tanto sacrifício, mergulhados no silêncio da vergonha, fiquei a reflectir um pouco no que estão a fazer àquilo que devia ser uma coisa nossa, bonita e que ajudasse as outras pessoas a enfrentarem os desafios e obstáculos que a vida lhes vai colocando no caminho.

Tudo se passou nos Jogos Paralímpicos de Sydnei. A equipa de Basquetebol de Espanha estava imparável e arrecadou a medalha de ouro de forma indiscutível. Depois um atleta que a integrava veio a público dizer que a maioria dos jogadores não possuía qualquer tipo de deficiência mental. Tudo não passou de uma ideia dos dirigentes para angariar mais apoios para o Desporto Adaptado.

Estava assim aberto um precedente bem negro para o já obscuro mundo do Desporto praticado por atletas- já de si com reduzidas oportunidades de participar em provas desportivas. Estes dirigentes e as suas ideias maquiavélicas estão a matar o Desporto para Deficientes e os seus princípios essenciais. De cada vez que se fax algo semelhante, há sempre uns tantos atletas que tinham o sonho de participar naquelas competições que ficam em casa por os seus lugares terem sido ocupados por pessoas que também não tiveram o mínimo de escrúpulos ao alinharem num plano desse género sem pensarem que isso iria prejudicar todos os outros atletas como está a suceder agora.

Gostava imenso de saber o que ia na cabeça daquelas pessoas que contribuíram para que assistíssemos a uma cerimónia protocolar tão triste. Teriam essas pessoas pensado no que estavam a sentir aqueles três atletas ali no pódio a olhar para as medalhas que haviam ganho sem que tivessem cumprido o sonho de ver as suas bandeiras subir ao som de um hino?

Ao pactuarem com o princípio dos “falsos deficientes” para darem mais visibilidade aos eventos desportivos, os dirigentes não pensam no que acontece de mau ao Desporto e aos atletas que têm realmente uma deficiência. O nivelamento por alto dos resultados nas competições faz com que se restrinja o número de atletas participantes e que sejam retiradas provas em que participem pessoas com deficiências mais profundas.

Isso já se pode comprovar nas listas de mínimos para os próximos Jogos Paralímpicos. Algumas provas foram retiradas em prol do nível competitivo sem se pensar no dano psicológico e motivacional que isso vai causar nesses atletas. E isso lá importa para os sanguinários dirigentes que regem o Desporto praticado por nós?

Temo que esta atitude leve a que cada vez mais as federações recorram a pessoas contratadas para se fazerem passar por deficientes e deixem os verdadeiros deficientes em casa a lamentarem-se da sua sorte, como fizeram os espanhóis.

Para combater este tipo de comportamento altamente nocivo há que tomar medidas. Em primeiro lugar, penso que o Desporto para Deficientes devia ser uma variante do Desporto onde os valores humanos estivessem acima dos valores competitivos e dos valores monetários. Penso que assim todos se sentiriam melhor, consigo próprios e com os outros. Ao restringir o número de atletas e o seu nível, está-se a privar alguns cidadãos que passam necessidades de se projectarem e de conviverem com os seus semelhantes com quem o contacto se torna impossível.

Os melhores atletas deveriam, no entanto, de ter oportunidade de competir com os melhores e entre os melhores. Acho que deveriam ser integrados com os atletas ditos normais e classificados à parte, caso se sentissem injustiçados. Se conseguissem algo entre os normais, seriam classificados a par com eles. Acho que era o melhor prémio dado a esses atletas que conseguem superar as suas limitações.

Assim eu penso que acabaria a falcatrua que cresce cada vez mais à medida que se afunila mais o acesso às competições. Eu não compreendo como uma pessoa aceita o jogo desses senhores e se faz passar por deficiente, mesmo tendo consciência de que está a transformar o nosso Desporto em algo inqualificável.

Sou um pouco suspeita para falar nisto porque não sei o que é viver sem ter uma deficiência e é muito difícil para mim pensar nos motivos que levam uma pessoa vulgar a fazer-se passar por deficiente mental, visual ou por pessoa ainda mais deficiente que aquilo que é.

Se eu fosse uma vulgar atleta que andava por aí a treinar e algum dirigente viesse ter comigo e me oferecesse dinheiro ou lá o que fosse para eu me fazer passar por deficiente, penso que não aceitaria. Por mais que o meu sonho fosse representar o meu Pais, preferiria que esse dia tivesse de chegar com o meu mérito e não pelo demérito dos outros que ficariam em casa para eu ir e conseguir arrecadar uma medalha de ouro com uma marca surpreendente, correndo ao lado de atletas que não estão em igualdade de circunstâncias comigo.

Mas aqueles atletas espanhóis quando aplicavam resultados surpreendentes aos adversários não pensavam que estavam a fazer algo deplorável, a aproveitar-se deles para conseguirem os seus intentos?

Isto são situações que me entristecem e me preocupam. Até nas coisas feitas a pensar em nós somos descriminados e os dirigentes sem escrúpulos fazem o que querem de nós. É lamentável observar que o Desporto para Deficientes se transformou num mundo cão!

Previa-se um dia quente. Levantei-me bem cedo como tem de ser numa casa onde agora vivem mais duas pessoas. Ontem alteraram o horário sem sequer nos consultarem e gerou-se a revolta. Dizem que é a nível experimental. Se assim é, julgo que essa mudança de horário não vai por diante.

Para minha casa veio uma amiga minha que eu conheci em Miranda do Corvo. Iria reencontrá-la nesse dia e isso animava-me. Ajudei-a a mudar as coisas antes de ir para um treino que teve de ser alterado.

Depois de me terem dito que não se podia treinar no Estádio, seguia o meu caminho de volta para a ACAPO. Foi aí que alguém me chamou. Era alguém que eu não esperava que me reconhecesse na rua. Fiquei bastante surpreendida, pois já não via essa pessoa há anos.

A solução foi fazer um treino de bicicleta antes de ir para casa ver o jogo dos sub 21 entre Portugal e a Polónia. Portugal venceu por 2-0. Eu já estava a dormir, daí não me ter lembrado dos autores dos golos.

Do dia- para alem das esperadas medalhas dos meus colegas nos mundiais de Atletismo- chegou também a notícia da vitória de Sérgio Paulinho na décima etapa da volta a Espanha. O ciclista português chegou à meta isolado e conseguiu que, trinta anos depois, a vitória falasse a nossa língua.

Situação do dia:
O treino teve de ser alterado porque a Académica treinava à porta fechada.

Bacorada do dia:
Pilota de Fórmula 1” (como?!!!!!)

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