Sunday, November 05, 2006

Da esperança à tristeza e à revolta

Saí de casa cedo e rumei à cidade. Estava um Sol radiante e o dia prometia ser quente. Não estou só a falar de temperaturas. Era um dia decisivo para a realização daquilo que eu mais desejava: ir à Holanda com os meus colegas e ali reencontrar alguns dos meus amigos que não vejo desde 2001.

Era o que eu mais queria neste momento. Era a oportunidade de realizar todos os meus sonhos que tanto anseio. Visitar a Holanda tornou-se um objectivo prioritário, mais ainda quando a minha doença se agravou. É minha intenção ir até lá enquanto ainda tenho alguma acuidade visual. Gostaria de ainda ser eu a tirar fotos que guardarei como guardo religiosamente as que tirei em 2001. (ver fotos) Aí estão registados momentos inesquecíveis da minha vida passados ao lado de pessoas que não esqueço até hoje e que sonho encontrar. Que bonito seria reencontrar essas pessoas tão especiais no local onde eu sonho estar e onde alguma coisa me diz que encontrarei aí a minha felicidade. Só que há pessoas que impedem que eu seja feliz. Não sei porque é que elas fazem isso, mas gostaria de saber um dia.

Estava a dar uma segunda oportunidade a essas pessoas para se redimirem do que fizeram em 2003 quando também não me deixaram ir à Holanda. No entanto, o que essas pessoas fizeram foi fazer com que toda a mágoa e todo o ódio que eu sinto por elas se alastrasse ainda mais.

Eu não conheço pessoas tão insensíveis como os dirigentes da Federação Portuguesa de Desporto Para Deficientes. As pessoas que têm a oportunidade e a obrigação de me ajudar não fazem nada, ou melhor, até fazem. Aquilo que é mais baixo e que não passaria pela cabeça do mais maquiavélico ser deste Mundo.

É incrível eu dizer isto mas, se não fosse o Carlos Lopes e o Paulo Coelho se lembrarem em 2005 de promover um encontro de atletas e se terem lembrado de mim- apesar de a minha presença nesse almoço ser incerta devido aos problemas nos olhos- estaria até ao dia de hoje sem ver os meus colegas. Isto é demais! Na altura os meus colegas, que eu ilibo de todas as críticas que aqui faço e só não vou mais longe porque também eles merecem outros dirigentes a comandar os seus destinos, homenagearam-me. Os poucos dirigentes que estiveram presentes no almoço também me prometeram ajudar, só que tudo caiu no esquecimento e nunca mais disseram nada, apesar de saberem o que me estava a acontecer.

Ao mesmo tempo, pessoas anónimas de Norte a Sul de Portugal, completamente fora daquilo que é lidar com alguém diferente, foram impecáveis comigo e deram o seu contributo para que eu me sentisse mais feliz, apesar de receber más notícias a cada consulta que ia. Se não fossem essas pessoas e alguém muito especial que, apesar de estar bem longe e de eu também não o ver há muito, me deu sempre uma palavra amiga. Não sei o que seria da minha vida. Enfrentar toda aquela situação sozinha não é fácil. Hoje estou eternamente grata a todos os que me deram o seu apoio e, ao mesmo tempo, estou bastante triste por as pessoas da FPDD esquecerem tudo aquilo que fui e o que dei ao Desporto Para Deficientes.

Não queria que me dessem dinheiro. Apenas imploro que me deixem ser feliz ao lado das pessoas de quem eu gosto. Não queria mais nada. Apenas que me respeitassem enquanto Ser Humano e enquanto atleta. Gostaria que todo o trabalho que faço diariamente com tanto sacrifício e sem condições humanas e materiais fosse recompensado com uma simples participação em provas nacionais. O outro dia fiquei bastante triste porque os senhores dirigentes, ou lá quem foi, tiveram a ideia de organizar o Campeonato Nacional de Atletismo Para Deficientes Mentais em Coimbra. O que se passou foi que alguns dos meus colegas deficientes visuais participaram nessas provas e ninguém teve a gentileza de nos dizer a nós, atletas que treinamos naquele mesmo Estádio, que também poderíamos participar. Nesse dia eu estava na cidade e não me custava nada ir lá fazer as provas ou, simplesmente, cumprimentar os meus colegas que não vejo há muito. Isto é brincar com uma pessoa! Não tem outro nome. Ainda por cima, aqueles dirigentes deveriam saber que teríamos falta de transporte para nos deslocarmos a Seia. Lutei muito para conseguir regressar ao Desporto. Vão esses senhores e fazem-me isto!

Pior foi o que me fizeram agora. Foi uma machadada final em mim, nos meus sonhos e nos meus sentimentos mais profundos. Ligaram-me no dia 1 de Agosto e prometeram dar uma resposta. Até ao dia 18 ainda não tinham dito nada. A minha irmã ligou para o Carlos Lopes que foi averiguar o que se passava. Da Federação disseram-lhe que a resposta tinha seguido para a Delegação da ACAPO em Coimbra. Só que eles tinham obrigação de saber que a Delegação fecha durante o mês de Agosto. Se não sabiam, é ainda mais grave e mais lamentável. É sinal de que eles, pura e simplesmente, riscaram a Delegação de Coimbra e os atletas de Coimbra do mapa. Já imaginava uma coisa dessas quando não levaram o Paulo aos campeonatos de 2005, apesar de ele ter mínimos. Agora veio a confirmação. Lamentavelmente, trabalhamos os dois para aqueles senhores lá de Lisboa nos fazerem isto.

O telefonema da minha irmã a dar conta dessas péssimas notícias surgiu quando já tomava o caminho da paragem do autocarro para a rodoviária. Não pude controlar as lágrimas que me escorriam pela cara. Sorte que as ruas de Coimbra são um deserto no mês de Agosto.

Foi já em Anadia que alguém me perguntou qual a razão da minha tristeza. Foi uma pessoa amiga que me deu boleia para casa. Não pude esconder toda a revolta que ia dentro de mim.

A minha mãe ligou para Lisboa e uma funcionária prometeu ajudar. A esperança voltou a surgir de forma ténue. Sabia que certo dirigente é aquela pessoa que se sabe...

Ao mesmo tempo que ouvia alguma música holandesa que tenho, as lágrimas caíam. Seria difícil mudar o rumo das coisas. Mais uma vez, as pessoas negaram-me ajuda.

Mas falemos de outro assunto mais leve e mais festivo. O Sporting apresentou-se aos seus associados frente ao Inter de Milão de Luís Figo. O jogo terminou empatado a zero e Figo foi alvo de uma bonita homenagem por parte dos dirigentes e adeptos leoninos. Sinal de que o mundo do Futebol, tantas vezes acusado de ser cada vez mais desumano, ainda reconhece o humanismo e o mérito das pessoas. Por seu lado outras modalidades desportivas que ainda procuram credibilidade não seguem esse exemplo.

Situação do dia:
Estava um dia muito quente e os gatos procuravam um local onde não sentissem tanto os efeitos do calor. A noite já caía quando o gato Léo se lembrou de se estender ao comprido no pior sítio onde alguma vez se pudesse deitar: no meio da estrada. E se vinha um carro?!!!

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