Wednesday, June 30, 2010

Ter emprego e não ter

Confesso que estou a ficar bastante desiludida e um pouco cansada do meu emprego. Faltam cerca de dois meses e meio para terminar o contrato de meio ano e eu estou serialmente a pensar em não o renovar.

Em relação ao trabalho propriamente dito, não tenho nada a dizer. Estou de consciência tranquila quanto ao que consigo ou não consigo fazer. Todos os dias me esforço por dar o meu melhor e, se alguém notar que as coisas não devem ou não podem ser assim, é porque simplesmente não posso fazer mais.

A entidade patronal até está satisfeita comigo, segundo foi dito a responsáveis da ACAPO. Têm plena consciência de que não podem exigir de mim o mesmo que exigem das minhas colegas e cada progresso que eu possa fazer é uma agradável surpresa para eles. Sabem que faço o meu melhor dentro das minhas limitações e não me cobram o impossível como fazem, por vezes, as minhas colegas ou mesmo os clientes.

Pondo-me no lugar das minhas colegas, até as compreendo mas pondo-se elas no meu, a compreensão já não é recíproca. Não sei se elas notam a diferença de tratamento de mim para elas mas as vezes esquecem-se que têm cem por cento de visão e eu apenas dez. Não conseguem imaginar que uma tarefa que desempenham de determinada maneira e com determinada rapidez tem de ser desempenhada por mim de uma outra maneira. Tenho de as compreender, pois, e fico um pouco frustrada porque, alegadamente, as estou a sobrecarregar de trabalhos que elas entendem que eu deveria fazer. De maneira nenhuma as quero sobrecarregar de trabalho. Se elas demonstram isso, só tenho de terminar o meu contrato e ir a minha vida, tendo outra perspectiva do mercado de trabalho e chegando à conclusão de que, neste tipo de trabalho, é complicado estar integrada sem mágoa e sem a sensação de ser um encargo para as outras pessoas.

Os horários e a falta de acessibilidades são dois factores que me estão a deixar um pouco agastada. Perco em média cerca de uma hora só em deslocações. Nessa uma hora poderia estar a descansar ou a dedicar-me a mim própria e às actividades de que eu mais gosto. Tenho dias que saio de casa bem cedo mas regresso já é noite. Como tenho de me levantar cedo no dia seguinte, por vezes o tempo sobra para comer alguma coisa e ir dormir. O cansaço é muito para ainda ler um pouco ou para escrever- duas actividades a que agora me tenho dedicado mais a sério.

Quando eu suspirava por um emprego, queria também ter tempo para mim, para as minhas actividades, para ter tempo livre para fazer alguma coisa de que eu gostasse. Em 2007 trabalhava e ainda tinha tempo para praticar Desporto, para estudar e tinha os fins-de-semana livres para participar em algumas actividades de voluntariado ou da ACAPO. Com o trabalho ao fim de semana, para além do transtorno dos transportes (quando o Inverno chegar vai ser pior) ainda deixo de participar em algumas actividades que me agradariam. As minhas colegas trabalham, pois trabalham, mas saem do emprego e os sues veículos estão no estacionamento à sua espera. Eu terei de esperar meia hora ou mais por um autocarro. Elas dizem que saem sempre mais tarde e eu, se saio cinco minutos depois da hora, já estou aflita. Pudera! Esses cinco minutos podem significar que perdi o autocarro e tenho de esperar longo tempo por outro. Com isto não posso também fazer algo mais do que vir de casa para o trabalho e do trabalho para casa, quando era uma pessoa que participava activamente em tudo o que podia. Nas folgas elas pegam nos seus veículos e vão dar uma volta. Eu, se acaso surge uma actividade aliciante para eu fazer, logo tenho o azar de estar a trabalhar. Nem a horas de encontrar algum estabelecimento aberto para carregar o telemóvel ou o passe encontro. Assim não pode ser! Se faço sempre o mesmo horário, logo me questionam por que é que não faço fechos nem aberturas. Este domingo estive a fechar. Tive de ir para casa de táxi. Isto é muito complicado! Os meus familiares e amigos dizem que eu nem devia ter aceitado este emprego. Eu digo o contrário: com esta experiência dá para assinalar os prós e os contras de ter e não ter emprego. Aceitei porque a experiência que tive em 2007 foi bastante positiva. Ainda hoje sonho que estou lá a trabalhar mas lá havia algo que aqui não estou a ter e que a seguir vou relatar.

À medida que o tempo vai passando, cada vez mais vou sentindo que este não é, definitivamente, o meu espaço. Psicologicamente vou-me desgastando por estar a fazer um esforço enorme por me manter ali contra todo o tipo de adversidades que me são colocadas. Sou uma pessoa que detesta a multidão e a confusão inerente à sua presença. Algumas pessoas, como atrás referi, custam a aceitar-me sem fazer comentários, principalmente sobre os meus olhos queimados pelo uso prolongado de colírios para controlar o glaucoma. Eu, que sou uma pessoa que gosta de estar isolada, num ambiente tranquilo e sem ninguém a importunar a minha concentração, fico enervada em certos dias em que mal tenho espaço para trabalhar, tal é a confusão. Na Piscina, quando a confusão maior surgia, já eu tinha saído e também não estava à mercê dos toques das pessoas que, notando que eu vejo mal, me chamam à atenção dessa forma que eu detesto. Tocar-me é coisa que me faz muita confusão.

Como se isso não bastasse, quando eu deveria estar sossegada e com tempo para ler e para escrever, eis que as minhas colegas se encarregam de me aborrecer. Para além de fazerem imenso barulho (não as posso mandar calar porque, também elas, estão na hora do seu descanso), vendo que eu não lhes estou a ligar, tratam logo de me chamar ou de mencionar o meu nome. O facto de serem maioritariamente mulheres e terem habilitações académicas mais baixas do que eu completa o quadro de total inadaptação da minha parte. Com homens, fosse qual fosse o grau académico, sempre se poderia falar de Futebol. As mulheres dali falam todos os dias em dietas e em coisas ainda mais fúteis do que isso. É natural que eu não participe nas conversas. Aquele não é, de todo, o meu mundo. Quando eu tento, por instantes, estar no meu espaço, eis que elas me resgatam abruptamente e me provocam nervos desnecessários. Deixem-me em paz! Eu gosto de estar assim e é assim que eu me sinto bem. Estou a fazer aquilo que gosto e aquilo que, esgotadas outras possibilidades, um dia será o meu futuro. Acredito, desde há uns dias para cá e assim de repente, que posso tentar algo.

Tenho um curso superior. A entidade patronal desconhece-o e as minhas colegas também. Estou a pensar em contar a toda a gente a ver se pelo menos as minhas colegas me respeitam um pouco mais e aceitam as diferenças. Por essa razão não entendem a necessidade que tenho de ler, escrever, pensar, ter ideias e achar, cada vez mais, que este tipo de trabalho e este ambiente não favorece em nada e contribui para que o meu talento se degrade. Não contactando tanto com escrita, leitura e não tendo forma de exprimir as minhas ideias aprisiona-me. Tenho medo de ficar igual às minhas colegas e perder a minha identidade, aquilo que me torna diferente, o mundo que criei para fazer face às limitações que a vida me preparou.

Definitivamente não encaixo ali. Sinto-me aprisionada. Não leio, não escrevo, não pratico Desporto, não tenho o meu espaço protegido onde possa dar largas à minha imaginação… Estou a ficar esgotada. Sinto que me estou a perder um pouco e que isso será uma catástrofe para a minha vida futura.

Por tudo isto, pondero não continuar para além de Setembro. Não me sentindo bem psicologicamente nada mais posso fazer.

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