Monday, May 25, 2015

Faz dez anos que morri



O subconsciente é uma coisa incrível com que a Natureza dotou o Ser Humano. O que a seguir vou narrar é exemplo disso mesmo. Trata-se de um sonho com uma enorme carga simbólica, apesar de ter acordado às cinco e dez da manhã bastante confusa e algo assustada. Logo esses sentimentos passaram quando me lembrei que dia era hoje.

Enquanto vou narrando este sonho que pode parecer estranho, vou passando a banda sonora dele. É fácil de explicar também por que é que esta música está aqui.

Sonhei que estava no meu quarto lá em casa a ouvir rádio. Ouvia música e, a certa altura, anunciavam precisamente uma entrevista com Paulo De Carvalho onde o cantor falava da sua carreira e da sua vida. Não sei a que propósito veio isso mas todo o resto a partir daqui compreende-se.

Na sala havia uma enorme algazarra. Estava ali muita gente mas eu não conhecia ninguém. Vim cá fora ver o que era. As pessoas tiravam coisas de dentro de uma cómoda que na verdade existe ali mas praticamente só tem roupa.

Nessa cómoda estavam guardadas coisas velhas. O cheiro a mofo imperava. A certa altura, mesmo lá do fundo, retiraram um ramo de flores amarelecidas pelo tempo e a seguir…um pequeno caixão. Logo virei a cara. Já devem saber que eu tenho medo dos mortos em sonhos, o que não acontece na realidade.

A diferença ali é que aquele…era o meu caixão com os meus restos mortais. Ainda mais repulsa me deu quando tive conhecimento dessa informação. As pessoas agarravam-me e incitavam-me a que eu fosse ver. Olhando para a rua, ia ouvindo retirarem o que pareciam ser ossos.

Estava confusa, de cabeça baixa. Mil e uma coisas me passavam pela cabeça. Como era possível aquele ser o meu caixão, se eu estava ali, tão viva como toda a gente que ali estava? Algo estava errado.

Continuava a ser incitada pelas companheiras que ali estavam a pegar no meu próprio caixão. Eu recusava, virava a cara e continuava a olhar para a rua. Elas acusavam-me de cobardia, de não encarar a realidade. Mas que realidade?

Acordei confusa e sem acreditar no que tinha acontecido. Logo me lembrei a que propósito veio isto. Estamos no dia vinte e quatro de Maio de 2015. Faz dez anos que se pode dizer que a minha vida mudou. Perante um cenário limite, a partir esse dia vinte e quatro de Maio de 2005, ainda sem saber como sairia daquele calvário, do dia longo que foi aquele, iria, dali para a frente, encarar cada dia como se fosse o último.

Ninguém morre de Glaucoma mas as dores são horríveis e a pouca faculdade de ver pode-se esfumar num abrir e fechar de olhos. Por mais que esteja preparada para essa eventualidade que pode vir a acontecer, nunca se está verdadeiramente a postos para encarar essa realidade.

Naquele dia muita coisa me passou pela cabeça que latejava quase a ponto de explodir. Muito pensei eu na vida. Muito lamentei não ter feito. Tendo sobrevivido a tudo isto, com mais ou menos mazelas, vou aproveitando a vida, vivendo intensamente, divertindo-me enquanto tenho condições para isso. Podem-me julgar ou criticar mas, certamente, não passaram por uma situação como esta e recomendo que não venham a passar um dia. É algo que não se esquece, que fica marcado para sempre pela negativa na nossa memória.

Dez anos. Quem diria! Parece que foi ontem.

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