Era uma noite quente de final de agosto. Previa-se uma lua-cheia brilhante, de uma tonalidade alaranjada. Seria uma superlua a que todos desejariam assistir.
Gentes da cidade deixaram o brilho das luzes artificiais para se deslocarem para os campos, de preferência para sítios ermos onde não houvesse grande concentração de árvores e se pudesse olhar o Céu livremente.
Como a noite se previa agradável, muitos levaram mantas para se sentarem no chão e comida para partilhar. Vivia-se este acontecimento como se fosse uma festa. Ninguém vivo hoje teria oportunidade de experienciar outro fenómeno semelhante, pois anunciavam que outro fenómeno deste género ocorreria dali a trezentos anos.
Uma conjugação estranha dos astros levaria a lua a aproximar-se perigosamente da terra e a ser maior e mais brilhante do que ocorre habitualmente em noites de lua-cheia.
Velhos e novos já ocupavam os seus lugares antes do anoitecer. Não queriam por nada perder o surgimento da Lua. Para as gentes do campo especialmente, iria ser um acontecimento que estava a ser encarado até com uma pontinha de receio. As crianças não escondiam o entusiasmo. Eram autorizadas a estarem despertas pela noite dentro e não escondiam o sorriso na cara. Perguntavam aos adultos quando é que surgiria a Lua, tal como na véspera de natal perguntam se o pai natal ainda demora muito a trazer os seus presentes.
Eram oito horas da noite e sentia-se no ar uma certa magia, um certo mistério, um certo suspense. O Sol estava prestes a esconder-se para dar lugar á rainha da festa mas a claridade teimava em não dar lugar á escuridão.
Os minutos passavam e uma estranha faixa de luz amarela era cada vez mais visível no horizonte. O que seria?
Por entre conversas de circunstância, sorrisos e algumas trocas de comida e bebida para aconchegar o Estômago, os presentes foram constatando que aquela faixa amarela de luz se tornava rapidamente laranja e vermelha em alguns pontos. Era estranho, assustador e deslumbrante ao mesmo tempo.
Alguém estranhou que ainda continuava de dia e já passava das nove e meia da noite. Outro dos presentes disse que tinha feito uma caminhada há duas semanas por essa hora e ainda conseguia ver o caminho em perfeitas condições, nada de extraordinário.
Finalmente a faixa dourada descolou do horizonte e constataram que era uma enorme bola redonda. Seria aquilo a Lua?
De olhos arregalados e boca aberta de espanto, as pessoas estavam atordoadas a olhar para o Céu. Pareciam hipnotizadas de espanto. A bola de luz que seria a Lua preenchia grande parte do firmamento e a luminosidade era tal como se fosse de dia.
Nas extremidades, a grande Lua era de um tom sanguinolento, caminhando para o centro era de uma tonalidade dourada e brilhante. Era um espetáculo bonito e aterrador ao mesmo tempo.
Por aquilo que pareceu uma eternidade, ninguém falou. Afinal, o que haveria para dizer? Tanta coisa e, ao mesmo tempo, nada. Que palavras conhecidas poderiam descrever evento tão raro e maravilhoso. Dava a sensação que bastava estender a mão e logo conseguíamos retirar a Lua do Céu e segurala nas nossas mãos como se fosse um gigantesco balão.
Pela madrugada os telemóveis dos que fotografavam o Céu avidamente deixaram de funcionar. Simplesmente foram desligados ao mesmo tempo como que por magia. A gigantesca bola que era a Lua, pouco a pouco, foi ganhando uma tonalidade branca e começou a brilhar intensamente. Começaram-lhe a chamar Lua de prata. Era uma claridade que até ofuscava, quase como a luz do sol.
De repente e sem aviso prévio, aquela enorme luz brilhante simplesmente se apagou mergulhando tudo na mais medonha e terrífica escuridão. Foi como quando apagamos uma luz acesa em nossas casas usando um interruptor.
Crianças choraram, velhos benzeram-se e muita gente sentiu um arrepio funesto. Nunca tinham visto um Céu tão negro.
Os mais corajosos ainda estavam de olhos postos no firmamento a olharem para o vazio. Era estranho nem uma única estrela ser visível.
Assim se passou aquela noite. Muitas vieram a seguir. Tão escuras e tenebrosas como a do último brilho da Lua. As horas de sol davam normalidade aos dias mas as noites inspiravam um clima estranho e agoirento.
Mesmo nas cidades as pessoas recolhiam cedo. Tinham dificuldade em olhar para aquele autêntico poço negro que era o Céu. Ninguém conseguia explicar o que se passou com a Lua e com as estrelas naquela noite.
Dez anos foram passados desde o último brilho da Lua. A vida cá em baixo adaptou-se. Deixaram de haver marés. O Mar parou no tempo e a areia da praia tornou-se grossa e de uma tonalidade cinzenta.
Agora ver a Lua somente em fotos ou vídeos guardados religiosamente para mostrar ás gerações vindouras que o Céu tinha vida antes daquela noite em que a Lua brilhou intensamente para depois simplesmente desaparecer num abrir e fechar de olhos.
Estou sentada num banco á porta de minha casa. É uma noite de finais de agosto bastante quente. São nove da noite e o dia vai escurecendo. Escurece muito rápido. A temperatura cai a pique e o arrepio que me percorre o corpo significa muito mais do que o súbito arrefecimento noturno.
Algo de muito estranho e maligno se apoderou dos astros.
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