Terror inexplicável

 

Bastavam os primeiros acordes daquela música. Logo uma assustadora nuvem negra pairava sobre o espírito dela. Por vezes estava tudo bem. Ela ria, brincava, trauteava as canções que ouvia na rádio…

 

Mas aquela música dos Coldplay logo lhe alterava o humor. Ela não se sentia melancólica, sentia-se assustada, aterrorizada, com um pavor inexplicável.

 

Toda a gente dizia que aquela música era bonita. Grande parte do Mundo devia gostar dela. Era por isso que passava na rádio, em espaços públicos, na lista pessoal de alguém que passava na rua. para ela era o mais terrífico dos ruídos que alguma vez existiram no Mundo. Ela simplesmente tinha medo dessa música.

 

Tudo começou uma certa tarde. Ela até já tinha ouvido aquela canção antes mas era-lhe indiferente. Sob a areia quente de uma tarde de agosto, ela adormeceu por breves minutos. A praia estava cheia de gente mas a sua companhia era um pequeno rádio portátil. Ela passou o tempo a trautear músicas. Passava uma seleção com os maiores sucessos do momento.

 

Foi então que ela teve um sobressalto.  Algo se quebrou no seu interior. Ouviram-se os acordes dessa música que, dali para a frente, seria a principal causa dos seus pesadelos.

 

Naquela tarde de verão, apesar da areia escaldante debaixo do seu corpo, ela sentiu arrepios. Á medida que a música avançava, ela sentiu o seu espírito a tornar-se mais sombrio. Era como se a Morte andasse a passear por ali e se tivesse apoderado das notas que, todas juntas, formavam aquela canção.

 

Seria possível que só ela sentisse algo de muito ruim numa música aparentemente inofensiva? era medo puro, pavor genuíno, um peso no peito, uma tristeza sem nome. Aquela música puxava todo o tipo de sensações negativas.

 

Mesmo de noite, adormecendo distraidamente com o rádio ligado, acordava de um salto logo aos primeiros acordes daquela  música terrível. Imediatamente tateava ás escuras, tentando chegar o mais depressa possível ao botão do rádio. Por vezes a ansiedade apoderava-se dela e  acabava por demorar mais tempo do que era suposto. Parecia que forças malignas a queriam obrigar a ouvir a canção até ao fim.

 

Noites havia também em que a banda sonora dos seus pesadelos não era outra, que não esta  canção dos Coldplay. Cenas de morte, tristeza, desolação e abandono acompanhavam as notas tão conhecidas e apreciadas por muita gente no mundo.

 

Ela achava-se ridícula. Tinha de esconder que o seu maior medo tinha como origem uma simples música, uma canção que passa habitualmente na rádio, um tema dos mais marcantes de uma banda que movimenta milhões de fãs. Se confessasse isso a alguém, o que iriam pensar dela. Que enlouqueceu?

 

Ouviu falar da influência que a música tem na nossa mente mas isso não explica que alguém, no seu perfeito juízo, fique mortalmente apavorado quando ouve uma canção. Muita gente tem traumas com   certas músicas, pois estavam a passar nos momentos mais infelizes das suas vidas- quando foi anunciado que perderam alguém, quando tiveram um acidente, quando foram abandonadas…e no caso dela? O que terá acontecido para ter medo daquela música?

 

Foi algo que surgiu de repente. Algo inexplicável. Difícil de compreender. Ainda pensou consultar um especialista nestas coisas da mente mas, que iria dizer o psiquiatra, psicólogo ou psicanalista quando ela lhe confiasse que a razão de ter vindo á sua consulta era o pavor irracional de uma canção dos coldplay. Como iriam reagir? Talvez fosse o maior caso de loucura que alguma vez lhes apareceu na frente. Pior que isso, temia que a mandassem para trás com a porta do consultório a bater-lhe com força na cara e gritos de que não tinham tempo para aturar brincadeiras, que o consultório era um local sério onde se tratam doenças reais e não estavam para aturar desvarios.

 

Ela nem sabia o que fazer. Valia-lhe o facto que, com o passar do tempo, deixava de ser frequente ouvir passar aquela música por aí.

 

Foi então que, numa tarde de dezembro, a poucos dias do natal, ela fazia compras num centro comercial com umas amigas. Numa loja passava música ambiente. Ela ria e provava roupa. De repente e sem aviso, começou a tocar a última música que ela queria ouvir. Imediatamente ela largou os sacos das compras e correu precipitadamente para a rua. era tão forte a vontade de fugir dali depressa que não reparou na passagem de um autocarro  quando atravessava a estrada.

 

O impacto foi brutal e fatal. Nada houve a fazer. Ainda tocava a canção causadora da tragédia quando todos acorreram ao local ainda embasbacados com o comportamento inexplicável de uma mulher que aparentemente era normal. Só um estado puro de loucura e instinto de  sobrevivência levariam alguém a fugir assim.

 

Ninguém jamais imaginou que a sua vida terminou de forma trágica por causa de uma canção que toda a gente conhece e muitos adoram.