O Desporto está de
tal forma estrangulado pelos valores do dinheiro, da ganância, do
ganhar a qualquer preço, passando por vezes por cima das mais
elementares regras de respeito pelo Ser Humano que por vezes nos
levam a refletir onde isto vai parar daqui a uns anos. São os
milhões que o Futebol gera e os valores astronómicos que os clubes
chineses recentemente pagam por jogadores, são os subterfúgios cada
vez mais elaborados para se ganhar a qualquer preço, mesmo que para
isso os atletas se tenham de sujeitar a substâncias e tratamentos
que lhes prejudicarão a saúde para o que vai restar das suas vidas
depois que acabarem as suas carreiras desportivas e são as acusações
de corrupção, a desconfiança e os ataques pessoais que por cá
especialmente temos visto nas últimas semanas.
O que é o Desporto
afinal? Com que finalidade foi criado? Para mim é paixão, para
outros é um negócio puro e duro. Foi criado para divertir, para
fazer bem ao corpo e à mente, para nos realizarmos. Acima de tudo,
para nos fazer sentir bem. Não para servir de rastilho a guerras e
conflitos. Não para servir de pretexto a que o lado brutal do Ser
Humano venha ao de cima.
Já ouvi dizer que é
durante um jogo de Futebol que se vê o lado animalesco do Ser
Humano. As emoções mais elementares vêm ao de cima e os
sentimentos que fazem de nós entidades diferentes dos restantes
animais perdem terreno para o que nos faz ser semelhantes a eles.
Num Desporto cada
vez mais desvirtuado, ainda surgem alguns exemplos dignos de registo
que nos fazem lembrar que afinal estão ali seres humanos, não
máquinas ou animais.
Na passada
segunda-feira, a fria e distante cidade de Chaves foi palco de um
arrepiante episódio que posteriormente deu lugar a um dos mais
bonitos gestos de desportivismo e de respeito que vi no Futebol
Português no últimos tempos. Decorria o jogo entre o Desportivo de
Chaves e o Nacional da Madeira, tinha-se iniciado a segunda parte há
poucos minutos, quando houve um lance fortuito entre Carlos Ponck do
Chaves e Hamzaoui do Nacional da Madeira. O jogador da equipa
madeirense imediatamente ficou inanimado no chão e logo toda a gente
se apercebeu que a situação era grave. Começa aqui a incansável
colaboração de todos quantos faziam parte do corpo clínico da
equipa da casa que imediatamente correram para assistir o jogador da
equipa adversária que era, afinal de contas, um Ser Humano, que ali
estava em dificuldades. As cores que envergava pouco importavam
perante uma situação tão delicada.
Os adeptos do
Chaves, sempre ruidosos e incensáveis no apoio às suas cores,
ficaram em silêncio durante aqueles escassos minutos que pareceram
uma eternidade. Contaram alguns que lá estavam que aplaudiram o
jogador do Nacional quando este foi retirado do campo. Jogadores de
ambas as formações depressa se uniram, embora pouco pudessem fazer
ali, que não rezar para que nada de mau acontecesse. Segundo ouvi no
relato, o jogador mais apreensivo com a situação do colega de
profissão até era mesmo um jogador do Chaves – Leandro Freire
que, entrevistado no final do encontro, não deixou de desejar
rápidas melhoras ao jogador do Nacional.
A segunda parte
daquele jogo arrastou-se. Mesmo os relatadores e comentadores da
rádio onde estava a ouvir o jogo mencionaram ter ficado abalados com
o que se tinha passado e que mais abalados tinham ficado os jogadores
das duas equipas. Só no final do jogo é que toda a gente ficou a
saber que o avançado argelino do Nacional se encontrava bem e tudo
não tinha passado de um terrível susto.
Bem, hoje há redes
sociais. É fácil nos dias que correm termos mais conhecimento de
algumas coisas do que tínhamos no passado. Quando os adeptos do
Chaves que estavam no Estádio a ver o jogo regressaram a suas casas,
não deixaram de manifestar todo o apoio e carinho ao Hamzaoui. Tal
apoio estendeu-se também ao próprio clube que inclusive dedicou um
post no Facebook oficial ao atleta da equipa que naquela noite
defrontaram. Na publicação, referiam o facto de o jogador do
Nacional se encontrar são e salvo como tendo sido “o melhor golo
da noite”. O Nacional retribuiu e, também no seu Facebook oficial,
agradeceu à equipa médica do Desportivo de Chaves pela ajuda
naquela situação difícil.
No dia seguinte,
Nelson Lenho- Capitão do Desportivo de Chaves- fez questão de ir ao
hospital inteirar-se do estado de saúde do jogador do Nacional. Tal
atitude fez com que adeptos do Chaves e de outros clubes, de clubes
que até estão de costas voltadas normalmente, se unissem no apoio
àquele atleta, enaltecendo ao mesmo tempo o bonito gesto da equipa
transmontana.
Infelizmente, cá em
Portugal, estas bonitas atitudes passam à margem. As primeiras
páginas dos jornais estão sempre cobertas de intriga, de números,
de ataques pessoais, de dirigentes que substituem os atletas no
protagonismo.
Em vez de se ir às
instâncias internacionais dar a entender que os árbitros estão
comprados, que há esquemas para ganharem sempre os mesmos, para
muitas vezes caírem no ridículo e desvirtuarem o Futebol de um país
que por acaso até é Campeão europeu dentro de campo, deviam dar a
conhecer atitudes como esta. Apresentar o que de bom ainda temos por
cá. Ao contrário do que muitos apregoam, ainda há honestidade por
aqui. Ainda há respeito e alguém ainda se lembra que estão ali
atletas, não máquinas ou animais.
Sinceramente, penso
que esta atitude do Chaves acompanhando desde o primeiro momento o
jogador do Nacional da Madeira devia ser levada em conta para
atribuição de prémio de Fairplay.
Obrigada Desportivo
de Chaves por mostrar que ainda há Desporto de verdade e que os
verdadeiros Campeões não se extinguiram.
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