Consta que dormi toda a noite. O problema foram os sonhos
que tive imediatamente antes de acordar. Espreitando pelos estores corridos,
constatei que já era dia e o despertador iria tocar dali a poucos minutos. Já
não haveria tempo para voltar a adormecer e tentar sonhar com outras coisas
mais interessantes.
Esta não é a primeira vez que tenho um sono semelhante a
este. Algem da família da minha vizinha morreu e o funeral sairia lá de casa.
Neste sonho foi um rapaz jovem e a causa de morte foi uma doença contagiosa na
pele.
A azáfama era enorme na rua. Eu tentava refugiar-me em casa,
especialmente no meu quarto, para não estar a assistir a estes dolorosos
rituais. Na rua já havia muita gente e eu tinha-me vestido para fazer uma
caminhada. O meu rádio também estava alto para que nenhum som do exterior me
chegasse.
A minha vizinha levou para cima da mesa da sala um telefone
antigo, ainda daqueles de discar, e começou a fazer telefonemas de forma muito
atabalhoada. Enganava-se nos números, depois o telefone tocava de forma
estridente. Já nem o podia ouvir, apesar de o volume do meu rádio ter
aumentado. Ela queria avisar toda a gente da hora do funeral que era às quatro
horas desse dia. Eu estranhava o facto de o corpo ainda não ter chegado. Eram
três e meia da tarde.
Fui para o meu quarto novamente. Fechei a porta, aumentei o
volume do rádio mais uma vez mas o barulho na rua era crescente. Movimentos de
carros, pessoas, o normal nestas alturas. De repente, um silvo horrível faz-se
ouvir e abafa todos os sons. Como o descrever? Era um som prolongado, fazendo
lembrar o som dos amoladores, mas mais sinistro. Mas o que é que era aquilo?
Não resisti a olhar pela janela. Era o carro funerário…que
tinha parado à minha porta e estava a fazer manobras para voltar para trás.
Claro, aquele som horrível só podia vir de um veículo tão sinistro. Eu é que
desconhecia que aqueles carros fizessem tal barulho. Era um som mesmo
melancólico que causava angústia. Um som mesmo daqueles de fazer doer o
coração. Cravava bem fundo. A tristeza apoderava-se facilmente de quem o
escutasse. Era assim que me sentia ali. Espreitava. O carro seguia aos repelões
pela estrada, com uma tracção muito deficitária. Não dava para ver se havia o
caixão lá dentro. Parece que não, o corpo já tinha sido deixado em casa da
minha vizinha, de onde sairia o cortejo fúnebre. Agora o carro tentava dar a
volta e passar pelos outros veículos, penso eu. Depois talvez passasse por lá
por casa da minha vizinha, apesar de não me sentir com coragem e ânimo para o
fazer. De referir que não conhecia o falecido.
Acordei deste sonho com sensações bem reais. Pela claridade
que vinha da rua, não haveria tempo para dormir e recuperar destas emoções.
Será melhor assim?
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