Thursday, February 20, 2014
“Obrigaste-Me A Matar-Te” (impressões pessoais)
Infelizmente o fenómeno da violências doméstica parece continuar enraizado na sociedade portuguesa e cada vez com histórias mais tristes e mais dramáticas. Nos últimos tempos, talvez devido à crise que estamos a atravessar, que leva ao desemprego e a alguns comportamentos de adicção e de desespero, cada vez mais ouvimos falar de casos fatais de mulheres que perderam a vida às mãos dos seus companheiros por quem um dia se apaixonaram.
Bem, também não sabemos se foi o fenómeno que aumentou, se foi o facto de estarmos na era da comunicação de massas que leva a que estes casos hoje em dia sejam trazidos para o domínio público.
Esta divulgação de casos de violência doméstica que por vezes levam à morte de um dos elementos do casal (normalmente a vítima é a mulher, ao contrario do que acontece nesta história em que, farta de uma vida infeliz e violenta, a mulher coloca um termo na vida do marido agressor) levam-nos a pensar no quão cruel se tornou a sociedade, que nem para os que amamos temos amor e carinho para dar.
Este fenómeno já vem dos tempos dos nossos antepassados, com valores religiosos, machistas e um pouco retrógrados a servirem de suporte a uma desvalorização do papel da mulher na vida quotidiana. A Igreja manda a mulher obedecer ao marido, afinal jurou-o perante Deus. O facto de a mulher ter um emprego não ser comum nessa época também acentuava a sua vulnerabilidade e a sua dependência de um marido agressor. Nesta história escrita pelas jornalistas nortenhas Ana isabel Fonseca e Tânia Laranjo, o marido impediu a mulher de prosseguir a sua vida, a sua carreira, ela abdicou de um curso superior para ser doméstica e apenas servir aquele marido autoritário e violento. No tempo dos nossos avós, simplesmente não se usava ou não era permitido a mulher trabalhar. Aqui em Portugal, o Regime desencorajava por completo.
Quando se pensava que cada vez mais as novas gerações eram mais abertas e mais respeitadoras dos direitos do Outro, eis que ouvimos falar de formas mais refinadas e mais cruéis de violência doméstica. Antigamente o agressor batia com a mão, por vezes pegava em objectos para infligir castigo. Hoje há formas mais avançadas e mais duras de violência. Algumas delas encontram-se retractadas nestas páginas deste livro que acabo de ler. As autoras terão ido beber a uma e outra história que lhes passou pelas mãos e terão feito uma nova história ficcionada onde caberiam todos estes acontecimentos. O resultado é um livro marcante, com bastante emoção até.
Ao lermos estas páginas, a pergunta impõe-se, independentemente de se ser homem ou mulher (também existem alguns casos em que a agressora é a mulher, embora sejam ainda poucos): Será que eu aguentaria por tantos anos os maus -tratos de um homem como este Rui desta história? Assim a frio dizemos logo que não mas a realidade é bem diferente. A vulnerabilidade experimentada pelas vítimas impede-as de tomar uma decisão mais apoiada na racionalidade. O medo ainda impera, a incerteza no futuro tolda-lhes as ideias, a auto-estima é muito baixa ou nula.
Quando as vítimas de violência doméstica ouvem na televisão que outra mulher foi morta por procurar sair do inferno em que se encontrava, logo a réstia de coragem que ainda sentem desaparece. Infelizmente ainda há muito a fazer em Portugal para evitar que casais que partilham a mesma casa travem uma luta mortal em que apenas um viverá.
Continuamos pelo Norte, aliás, já lá vão três livros com a cidade do Porto como espaço de eleição. Tal como prometi, vou debruçar-me sobre mais uma obra de Carolina Salgado.
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