Thursday, August 24, 2017

Educar para descriminar

Ontem fiquei boquiaberta enquanto almoçava e ia ouvindo as notícias na televisão. Então não é que a Porto Editora colocou no mercado cadernos de atividades para crianças entre os quatro e os seis anos para meninos e meninas? Voltámos ao Estado Novo? Foi?

Não voltámos porque o próprio minuistro-adjunto da Educação, depois de inúmeras queixas, resolveu intervir e a Porto Editora suspendeu de imediato a venda desses manuais que não deveriam sequer ter visto a luz do dia nos tempos que correm.

Eu não sei o que passou pela cabeça de algumas pessoas aqui neste Portugal que não para de nos surpreender. Provavelmente isto vem de alguém com saudades da Educação do tempo do Estado Novo e da Mocidade Portuguesa, daquele tempo em que realmente é que era. Mais grave ainda, parece que foi uma mulher a elaborar estes livrinhos que fomentam gritantemente a diferenciação de género.

Depois a Porto Editora deveria ter tido outra abordagem antes de sequer colocar no mercado tais livros, sabendo-se desde logo que iam gerar polémica e não tardaria muito com as redes sociais logo a fazerem chover mensagens de desagrado, como estava bom de ver.

Nem é preciso folhear estes manuais de atividades para logo encontrar matéria alimentadora da desigualdade entre géneros. Basta olhar para a diferença exterior dos livros. Para os meninos é azul, para as meninas cor de rosa. As ilustrações também são diferentes e não me venham cá agora dizer que a diferença estaria nas ilustrações porque nem aí deveria estar. Era igual para meninos e meninas e acabou-se!

Para além da diferenciação de cores e desenhos, o que já é mau, as atividades também são diferentes. Num dos exercícios ou atividades, os meninos devem ir para a rua procurar objetos ou algo assim, enquanto que as meninas deverão ajudar a mãe a preparar o lanche. Mas o que é isto?!!! É o que eu digo, saímos para a rua para fazer uma revolução para isto.

Mas, quando se julgava que estes livros eram maus demais, ainda pioraram. Dizem (eu não tenho filhos, não folheei um livrinho desses) que os exercícios eram mais fáceis para as meninas e mais complexos para os meninos. O quê? Mas estas alminhas que elaboraram os livros são loucas? Só pode mesmo.

Que mais dizer sobre isto. Mau demais. Lamentável de mais. Estamos em 2017! Muito se lutou no passado, inclusive em Portugal, para os cidadãos terem a oportunidade de fazerem escolhas para a sua vida, sem que para isso sejam penalizados ou ostracizados. Todos lutámos- e ainda continuamos a lutar- por uma sociedade mais igual, onde podemos escolher livremente o que queremos ser e o que queremos fazer. Começar a colocar ideias retrógradas dignas de Estado Novo na cabeça de crianças tão pequenas não é definitivamente o caminho. De modo algum!

Ainda bem que isto se resolveu e que o nosso Governo recomendou a retirada destes manuais da discriminação do mercado. Pensar que alguma vez eles chegaram a existir num país que se diz civilizado e de primeiro mundo como é o nosso é simplesmente lamentável.

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